quarta-feira, 15 de janeiro de 2025

Invocação ao Sol (5)

Paul Klee, Castle with Setting Sun, 1918

Soltavam palavras de fogo

na superfície sulfatada da terra,

um jardim de ânimo transfigurado,

provérbios esquecidos

no porão da memória.

 

Os barcos vinham vazios,

sentavam-se mulheres ao sol,

a conversa para enxaguar

a mancha no descompasso da vida.

 

Acreditavam nos deuses,

milagres matinais entre heras,

o sol a cintilar nos fetos,

acácias na sombra da casa.

 

Terra vergada ao peso das luas,

sem o fogo do espírito,

submersa na humidade dos domingos.

Refreado pelo peso da luz,

o mundo caía na palha da noite.

 

Grãos de areia, sílica, mica,

quartzo iluminado pelo tempo.

No revérbero solar desta sabedoria,

um arquitecto ocioso trabalha

os dias e as noites, a sombra

fortuita na mantilha da memória.

 

(1993)

[Conjunto de cinco poemas pertencentes à série Cânticos da Terra Amarela]

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