terça-feira, 7 de janeiro de 2025

Meditações melancólicas (94) Afinal, nem parece um rei

René Magritte, El Mutilado, 1947

Há coisas que o melhor era não as fazer. Nada pior do que a transição que nos leva de uma imagem idealizada para outra que é real ou mais próxima da realidade. Foi uma péssima ideia a reconstituição facial em 3D do rei D. Dinis (ver aqui). Olhamos para a imagem, presumidamente mais autêntica do velho rei, e não vemos ali nem o homem de poder, nem o visionário, nem o poeta. Nada. Vemos um pobre diabo que parece nem acreditar no que lhe sucedeu, com uma coroa enterrada na cabeça. Os grandes homens históricos são iguais aos outros, mas nós temos uma necessidade de ver na sua imagem a grandeza que lhe atribuímos. Eles são, na realidade, idênticos aos políticos de hoje, mas estavam cobertos pelo véu do passado e pelas imagens idealizadas, que nos faziam pensar que eles eram de outra natureza. Revelar-lhes o rosto é, mais do que matá-los, matar as ilusões que usamos para nos identificarmos. Qualquer país preciso de uma mitologia e não há mitos sem encantamento. Inventem lá outro rosto ao pobre rei.

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