segunda-feira, 13 de janeiro de 2025

O antigo regime e a revolução

Paul Klee, !Todo corre em pos de algo!, 1940

Steve Bannon, uma influente figura política da direita radical, não morre de amores por Elon Musk, o hiper-milionário que ajudou a eleger - talvez o melhor seja mesmo dizer que elegeu - Donald Trump. Bannon acusa Musk de se interessar apenas por si e por ir aumentando a sua colossal fortuna e com isso aumentar o seu poder (aqui). Será que o problema colocado por Musk é o de se interessar apenas por si mesmo? Não terá ele um projecto político para os EUA e para o mundo?

Um artigo de João Pedro Pereira, no Público (aqui), tem o curioso título O novo regime, por Peter Thiel. Menos conhecido do que Musk ou Zuckerberg (dono do Facebook), aos quais ajudou a criar as suas fortunas, Thiel move-se nas mesma águas e mostra que o interesse das grandes figuras ligadas ao universo das tecnologias de informação e comunicação e inteligência artificial não é meramente uma questão de criar condições para fazerem mais e melhores negócios, mas um projecto político, cuja configuração é fluida, mas que se vai afirmando.

Numa entrevista dada ao Finantial Times, citada no artigo do Público, afirma: O nosso antigo regime (refere-se às democracias liberais) tal como a aristocracia da França pré-revolução achou que a festa não acabaria. E depois de argumentar que, na verdade, a eleição de Biden em 2020 foi uma anormalidade, remata: Não haverá uma restauração reaccionária do passado pré-internet.

O que ele diz é o seguinte: a internet e o que se lhe seguiu são uma revolução política, a qual deve ser lida em consonância com o modelo de todas as revoluções, a Revolução Francesa. Ora, isso significa que o modo de fazer e pensar a política dos democratas liberais, gizado quando não havia internet, é tão anacrónico como o modo de fazer e pensar a política do Antigo Regime, que a Revolução Francesa derrubou. Diz ainda o seguinte: o modo de fazer e pensar a política à maneira das velhas democracias liberais não será restaurado. A vitória de Trump é uma derrota dos restauradores da velha ordem liberal.

A alteração mais clara que se deu na política foi a sua virtualização. A transição do conflito político do espaço público tradicional para um espaço virtual. Esta virtualização, porém, não é inócua. Dá enormes poderes de influência aos detentores das redes sociais, e são estes que transportam em si projectos políticos que pretendem estruturar o novo regime nascido da destruição, em curso, das democracias liberais, as quais ainda se movem numa dimensão analógica e pensam a política a partir dos valores morais provenientes do Iluminismo, do Liberalismo e da Revolução Francesa.

As novas configurações são obscuras, mas é provável que, com a tomada de posse de Donald Trump, se comece a perceber o que traz o novo regime, embora Trump seja apenas um figura intermédia, alguém que penetrou no regime liberal norte-americano e o começou a desestruturar, sem saber muito bem para onde pretende ir. Aquilo que parece estar a emergir é a morte dos próprios ideólogos da direita radical (para não falar já dos outros), como Steve Bannon, pois fazem parte de um mundo pré-internet. 

Se se quer perceber que novas configurações do mundo, a Ocidente, se estão a desenhar é preciso estar atento ao que pretendem estas personagens que fazem parte de um bolha de hiper-milionários ligados à internet e a tudo aquilo que lhe sucedeu. Eles não têm apenas o poder do dinheiro, como os antigos milionários, mas têm o poder de formatar a opinião, de a dirigir e de a fazer acreditar no que bem entenderem. Juntam o poder económico, preponderante nas democracias liberais, ao poder religioso, no sentido de formadores de crenças que, como as crenças religiosas, não são verificáveis. Parece desenhar-se uma oligarquia, mas os seus contornos são ainda difusos. O ano de 2025 poderá ser rico em ensinamentos sobre para onde o mundo vai correr e como se vai desenvolver a revolução em curso há décadas, uma revolução permanente.

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