sábado, 8 de outubro de 2022

Os novos tempos


Não é implausível que daqui a cinco anos, após as presidenciais francesas, todos os países latinos da Europa do Sul sejam governados – pelo menos em coligação – por forças de extrema-direita. Um primeiro passo está dado em Itália. É verdade que, neste país, a presença da extrema-direita no governo não é uma novidade. O primeiro caso deu-se com os pós-fascistas da Alleanza Nazionale, de Gianfranco Fini. Vieram depois outras experiências e, agora, uma coligação do partido de Berlusconi com Salvini, de La Lega, e o novo fenómeno político italiano, Giorgia Meloni, dos Fratelli d’Italia, também um partido pós-fascista. O futuro da coligação, como sempre acontece por aqueles lados, é muito incerto, mas não será impossível que a Itália, nos próximos anos, tenha sempre, de uma forma ou de outra, a extrema-direita no governo.

Na Península Ibéria, as próximas eleições legislativas deverão marcar o momento em que a extrema-direita espanhola, através do Vox, e a portuguesa, através do Chega, alcançam a governação. Já se percebeu duas coisas, tanto lá como cá. Em primeiro lugar, a direita democrática – o Partido Popular (PP), em Espanha, e o PSD, em Portugal – não terá qualquer hipótese de chegar ao poder sozinha. Em segundo lugar, nem o actual PP nem o PSD de Montenegro sentem uma séria repulsa pelo Vox e pelo Chega, aliás, fundados por antigos militantes de um e de outro. Aquilo que os une é mais do que aquilo que os separa. Une-os uma visão liberal da economia e conservadora dos costumes, embora com algumas resistências neste caso tanto no PP como no PSD. Separa-os o verniz, a linguagem e alguns aspectos civilizacionais. Quanto a França, poderá ser impossível, em 2027, travar a senhora Le Pen. Os tempos estão de feição para este tipo de soluções políticas.

Para além da questão dos imigrantes e da presença muçulmana, embora não seja esse o caso português e, em parte, o espanhol, três factores parecem propícios a esta escalada da extrema-direita. O primeiro é a degradação da situação económica, o retorno em força da inflação e o concomitante descontentamento popular, que a esquerda deixou de ser capaz de mobilizar. O segundo é uma mistura de ressentimento social e de incompreensão das transformações ao nível dos costumes. Por fim, o poder de atracção que as soluções autoritárias e iliberais poderão exercer sobre eleitorados à deriva, desejosos de encontrar quem os pastoreie, num mundo complexo, onde a possibilidade de indivíduos e comunidades encontrarem uma vida tranquila e satisfatória está a desaparecer. São os novos tempos, mas nada de novo sob o Sol.

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