Esteban Vicente, Series Alison: Armonía, 1976 |
Uma paliçada separa um jardim familiar do passeio. Vêem-se algumas
árvores, canteiros de flores, sombras, estreitos caminhos por onde a família passará,
ora para usufruir do pequeno paraíso, ora para superintender o cuidado que o
jardineiro, contratado à hora, dará ao lugar. Depois, ergue-se o prédio, uma
daquelas grandes casas citadinas que mais tarde serão divididas e transformadas
em apartamentos, mas isso será muito depois. Na rua, ainda não se vêem
automóveis, apenas uma ou outra tipoia e, de quando em vez, uma sege apressada,
como se um destino longínquo aguardasse os ocupantes. O passeio é uma mistura
de lajes brancas e de gravilha, rematado, no lado da estrada, ainda de macadame,
por uma calçada estreita de pedra escura. A espaços iguais surgem candeeiros de
iluminação pública, alimentados a gás, apontam para o céu, acusando-o de,
chegada à noite, se demitir da obrigação de iluminar os homens, e, por essa omissão,
eles, pobres artefactos humanos, se verem constrangidos a tomar-lhe o lugar e a
fazer tão mal aquilo que, durante o dia, o céu faz de forma inexcedível. Ao
longe, um grupo de pessoas, com os seus fatos dos finais do século XIX,
conversam à sombra de uma árvore. Ouvem-se gargalhadas, palavras soltas, o
burburinho de quem se diverte. Mais à frente, uma mulher, de vestido claro que
lhe chega aos pés, com mangas em balão, cintado de forma generosa, para que os
seios cobertos por folhos triunfem exuberantes diante dos olhos que para eles
se voltem. Caminha apressada, passos firmes, segurando, na mão direita, uma sombrinha
que lhe protege o chapéu na cabeça e vela o rosto, tingindo-o com um enigma,
que talvez ninguém descobrirá. A pressa que os passos indiciam mostra a
urgência que a move. Passa por ela um cão. Ouve-se rosnar e um súbito silêncio
cai, enquanto a mulher desaparece no fim da rua.
Bem bonitas as ruas do passado.
ResponderEliminarUm abraço
Muito obrigado.
EliminarAbraço