Talvez nos anos 90 do século passado e no início do novo milénio isso fosse uma evidência para a generalidade dos cidadãos dos países democráticos e para muitos que, noutros regimes, ansiavam por uma democracia liberal. Hoje aquilo que era uma evidência generalizada deixou de o ser. Não apenas cresceram, com apoio popular, novos regimes autoritários, como nos próprios países democráticos a evidência da superioridade das democracias liberais é cada vez menor. Largos sectores escolhem políticos e programas iliberais, a militância radical cresce e tem presença avassaladora nas redes sociais, exibindo uma agressividade retórica impensável ainda há pouco. A questão filosófica sobre o melhor regime, questão que animou o pensamento de Platão e Aristóteles, e que no final do século passado parecia resolvida, exige que se volte a ela.
O problema,
todavia, não pode ser enfrentado com um retorno ao debate tal como ocorreu na
Antiguidade, onde se questionava se o melhor regime era a monarquia, a
aristocracia ou a democracia. Também não bastará modernizar a questão e
discutir sobre se o melhor regime é a democracia liberal, a democracia
iliberal, o regime autoritário, o regime totalitário, etc. Antes da questão do
melhor regime, está uma bem mais radical sobre o que é esse campo da acção
humana a que se dá o nome de “político”. Muitas vezes a discussão sobre o
melhor regime assume que sabe o que é o “político”, mas este é, apesar da sua
omnipresença, um fenómeno obscuro e difícil de captar na sua natureza. Sem o
seu esclarecimento, qualquer tentativa de definição do melhor regime está
condenada. Esse esclarecimento, por outro lado, ajudará a compreender as razões
por que a evidência da superioridade das democracias liberais está a
desaparecer e por que os seus defensores parecem perdidos.
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