terça-feira, 4 de março de 2025

O calvário da esquerda moderada


Assiste-se a um declínio do centro-esquerda, que foi, juntamente com o centro-direita, um dos pilares dos sistemas políticos europeus. Nas últimas eleições alemãs, o SPD (Partido Social-Democrata, equivalente ao Partido Socialista) teve a votação mais baixa desde o final da Segunda Guerra Mundial. Isto ocorreu após ter vencido as eleições anteriores e formado um governo de coligação que não chegou ao fim. Em Inglaterra, nas últimas eleições, em 2024, o Partido Trabalhista (também um partido irmão dos socialistas) obteve uma vitória retumbante em termos de lugares no Parlamento — quase dois terços dos deputados são trabalhistas. Menos de um ano depois, as sondagens mostram uma queda acentuada das intenções de voto nos trabalhistas.

Em França, os socialistas dão alguns sinais de vida, mas a velocidade da sua recuperação é muito lenta, não os tornando uma solução. O mesmo se pode dizer dos socialistas gregos. Na Áustria, têm ainda alguma força, mas longe daquela que os fez o pilar fundamental da governação. Mesmo em Espanha, onde ocupam o poder, as últimas sondagens trazem-lhes más notícias. Em Portugal, a situação não é radiosa. Apesar da governação — muitas vezes incipiente — de Montenegro, os socialistas portugueses não descolam, nas sondagens, do PSD. Apenas nos países nórdicos, o centro-esquerda continua a ser uma força pujante e claramente determinante. Um dos factores do enfraquecimento da esquerda democrática estará associado à polarização política trazida pelo crescimento da extrema-direita e da direita radical.

O problema, porém, pode ser mais profundo: uma desadequação entre os programas e as práticas políticas do centro-esquerda e as expectativas dos cidadãos. Por outro lado, toda a esquerda parece incapaz de perceber as mudanças que se vivem — tanto na área tecnológica como na área geopolítica. As redes sociais e a democratização do uso da inteligência artificial têm sido um calvário para a esquerda, incapaz de adequar a sua retórica, os seus valores e as suas práticas ao novo ambiente onde decorre a disputa política. Além disso, as mudanças geopolíticas — em que a eleição de Trump representa uma revolução — são pouco propícias às posições do socialismo democrático e da social-democracia. Se o centro-esquerda pretende ainda ter um futuro na Europa, deverá, em primeiro lugar, olhar para as reais expectativas dos eleitores. Em segundo, fazer uma profunda reflexão sobre os seus desaires e o mundo em que se vive. Por fim, observar as razões da pujança do centro-esquerda nos países nórdicos. As democracias liberais precisam de uma esquerda moderada forte e não moribunda.

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