sexta-feira, 31 de agosto de 2012

Uma estranha sensação de fim



De tudo se apossa uma estranha sensação de fim. A nova avaliação de Portugal pela troika ou o pedido de resgate da Catalunha a Madrid não significam que se está a remediar uma situação para que ela possa persistir nos antigos moldes. Como a multinacional Unilever bem sabe (pois está a preparar-se para o retorno da pobreza à Europa), estamos perante sintomas de que uma nova configuração da realidade social emerge. Mas não é apenas ao nível económico que esta sensação de fim de estação se manifesta. Também as alterações climáticas e a intensificação de certas catástrofes naturais fazem crescer essa sensação de fim.

O mito escatológico do fim do mundo sempre seduziu a imaginação dos homens, mas essa sedução impede-os de pensar o que está em jogo na expressão. Fim do mundo não significa que o mundo vá acabar, mas que um certo mundo, com a cosmovisão que lhe é inerente, vai terminar. O que acontece, em geral, é que há uma forte inconsciência plasmada ou na crença imaginária de que o mundo, como um todo, vai desaparecer, ou na crença de que a capacidade científico-tecnológica tem um poder infinito para evitar aquilo que sempre foi o normal percurso da história dos homens: o nascimento, a maturação e o fim de uma civilização. E por mais que se saiba que as civilizações morrem, há em nós, arreigada no fundo da nossa alma, a convicção de que a civilização moderna é eterna.

Estas convicções impedem-nos de ver os sintomas e os sinais e de interpretar essa sensação de fim que parece cair sobre todas as actividades humanas. Por isso, as discussões políticas e sociais fundam-se em modelos que são os do passado e têm como adquirido que a solução está nesses modelos. Uns julgam que o socialismo ainda está no horizonte. Outros exibem com despudor a necessidade de retorno a um liberalismo que conduziu a humanidade à primeira Guerra Mundial.

Ninguém quer perceber, porém, que chegou o tempo de uma nova frugalidade e uma nova forma de relação com a Terra. No Ocidente, a religião parece ter perdido o sentido. No entanto, depressa iremos descobrir, se não o estamos já a fazer, que palavras - que fazem parte da linguagem da religião - como sacrifício, jejum e abstinência voltarão ao vocabulário quotidiano. Este novo sentido representa já o fim do  mundo, fim daquilo que foi conhecido como sociedade do consumo ou sociedade do espectáculo. Do ponto de vista do conflito político, não se trata já de como distribuir a riqueza, mas pura e simplesmente como distribuir, com mais ou menos justiça, a nova frugalidade, isto é, a pobreza.

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