A minha crónica semanal no Jornal Torrejano.
Depois do predomínio da esquerda nos meios intelectuais, assiste-se
hoje em dia a uma maré cheia de intelectuais de direita que, desde a
universidade aos blogues, passando pelos jornais e televisão, tomaram conta do
espaço público. Apresentam-se como liberais, muitas referências à Inglaterra e
aos EUA (republicano e Tea Party, de
preferência), citam Hayek, Friedman, von Mises, fazem do combate ao socialismo,
que descobrem nos sítios mais inesperados, um modo de vida e um programa
político delirante. Fundamentalmente, odeiam França e tudo o que vem de Paris.
O espantoso nisto é que estes liberais são espécie que nasceu de
geração espontânea. Não há memória de haver tradição liberal portuguesa e
durante a ditadura de Salazar não se lhes conheceu qualquer manifestação ou
preocupação com a liberdade, o núcleo do pensamento liberal. Se lermos os seus textos,
depressa descobrimos que o liberalismo que defendem é sui generis. Defendem o liberalismo para evitar a concorrência. A
liberdade, para eles, só tem valor quando não os obriga a concorrer com os
outros e lhes assegura vantagens e privilégios sociais. As suas declarações de
amor à liberdade não assentam numa cultura do mérito, mas na defesa,
sub-reptícia, de uma competição social truncada e falsificada, onde eles têm
todas as vantagens.
Amam a Inglaterra não porque esta seja democrática, mas porque julgam
que, se fossem ingleses, teriam lugar cativo na câmara dos Lordes. Nos textos
que escrevem, os mais ricos – isto é, os mais fortes e mais poderosos – têm
sempre razão, o resto não passa de escumalha cujo desígnio é servir os fortes
e, por extensão e graça, também a eles.
Estão sempre prontos a denunciar as ditaduras de esquerda, o colapso
do socialismo real e mesmo do socialismo imaginário e, se formos leitores
descuidados, imaginamo-los os campeões da luta pela liberdade. Estes intrépidos
cavaleiros sempre prontos a defender a liberdade dos mercados e a sua
presciência, inimigos ferozes da regulação da actividade bancária e financeira,
que todos sabemos o que ela significa nos tempos que correm, têm um coração
frágil e sentimental. Não pense o leitor que se comovem com as desgraças dos
pobres. Não, eles amam a competição e os pobres perderam.
O que os comove até à exaltação é o Dr. Salazar. Nos seus corações liberais, há
um cantinho doce e suave para o homem de Santa Comba. Reescrevem a história,
negam os factos e adormecem enlevados na esperança de que o homem, um feroz
iliberal, reencarne para os proteger. São assim os nossos liberais.
Este texto merece ser "emoldurado".
ResponderEliminarQuanto aos tais sujeitos, os nossos liberais, gostava de os ver a lê-lo, se conseguissem. Esses intelectuais de pacotilha, patuscos que escrevinham e "palpitam" a troco das sinecuras chorudas que lhes alimentam o estatuto.
Jogadores e actores da mediocridade, se não lhes puserem uma pedra na mão não sabem que uma ditadura é uma ditadura, ser de esquerda ou de direita não passa de um detalhe de conveniência.
Alguns são reaccionários "ad nauseam", enteados do tirano, têm o "terreno de jogo" e o palco por sua conta, mas ainda os veremos sair, sob pateada, pelo túnel ou pela direita alta, apressadamente, antes de regressarem ao vão de escada de onde emergiram.
bfs
Abraço
A própria Monarquia constitucional (que representava um módico de liberdade perante as hostes miguelistas e descendentes) não conseguiu criar liberais. Menos ainda a República e o Estado Novo. A III República é o que se vê.
EliminarEstes são piores do que reaccionários. Alguns reaccionários são-no por uma ideia de Pátria, por uma visão do mundo e não por vantagens económicas. Mas esta gente não tem qualquer ideia a não ser a ideia do dinheiro.
Abraço e bfs