segunda-feira, 22 de abril de 2013

O cuidado em instruir

Emil Nolde - Family (with Two Children)

Todavia, aqueles a quem não foi dado receber uma boa educação, não devem ter menos cuidado em instruir os seus filhos; mas, por isso mesmo, deveriam empenhar-se mais nestes aspectos. (Quintiliano, Institutio Oratoria, Liv. I, I 7).

Esta linguagem de Quintiliano tornou-se completamente incompreensível nos dias de hoje. O cuidado com a educação dos filhos apresentado como um dever, e como um dever daqueles que não receberam uma boa educação, é algo de absolutamente impensável no actual quadro social e político. Esta linguagem do dever foi substituída por uma certa sociologice desculpabilizante, que justifica as atitudes das crianças e dos jovens fundada numa teoria da reprodução. Não é que, como mostra a sociologia, não haja reprodução dos resultados e das atitudes perante a escola. Mas por isso mesmo, a linguagem política e social deveria acentuar muito claramente a necessidade e o dever dos pais - incluindo, por maioria de razões, os que não tiveram uma boa educação - de darem uma atenção especial à instrução dos seus filhos, o que passa pelo conjunto de regras e de comportamentos que eles devem ter para que não reproduzam o insucesso escolar parental. Este é o principal problema da educação em Portugal. Era este problema que muitos esperavam que o actual ministro da Educação enfrentasse. Esperança vã, pois Nuno Crato está mais preocupado com mega-agrupamentos, despedimento de professores e outras actividades de contabilista.

8 comentários:

  1. e reequacionar a missão da Escola Pública?
    Sabendo que as premissas não são favoráveis à cultura académica, a tão falada inclusão deveria ter acautelado estas dissonâncias.
    Existem muitas formas de o conseguir, talvez o modelo educativo que produz peças-pessoas para uma engrenagem que já não quer peças, e que já nem quer pessoas, mereça uma atenção e um cuidado especial. Nomeadamente em contextos onde tudo joga contra.
    sim os pais já não ensinam os meninos sequer a comer à mesa, mas os mesmos pais que é fácil culpar, estão na trincheira, sem trabalho, sem futuro, sem palavras para alentarem os seus filhos.
    ( e garanto-lhe, sou tudo menos pouco exigente com os meus, sejam alunos os filhos)
    Gostaria muito de o convidar, um destes dias para um debate sério sobre estes assuntos.

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    1. O problema é bem anterior à crise que vivemos e, talvez não sendo apenas português, tem um traço marcadamente português. O que sempre me deixou perplexo foi o poder político pela omissão, mas muitas vezes pela acção, ter reforçado uma cultura adversa àquela que é necessária à aprendizagem. Pactuou e fomentou uma cultura social que não valoriza as aprendizagens. Sei que há muitas dificuldades e sei que há muitas famílias que fornecem contextos adversos à instrução. Esse é o dado. Mas a acção política talvez devesse imaginar e actuar para contrariar essa facticidade, como em tempos actuou para diminuir a mortalidade infantil (esta é uma comparação que vale a pena fazer). Por outro lado, não se trata de os pais ensinarem os meninos, mas de os educarem de forma a que respondam à instrução que a escola lhes dá, de forma a criar neles, desde muito pequenos, o sentido do dever. Este é um problema global da sociedade e, por isso, é um problema político. O meu post vai nesse sentido.

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    2. Queira desculpar o tom inflamado com que escrevi. Sou uma defensora da escola pública,e concordo consigo qquando afirma que nc a quer reduzir a escola miníma para os que nada podem exigir.
      boa noite,

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    3. Não há qualquer razão para pedir desculpa. A paixão pelas ideias é, até certo ponto, uma coisa boa. E, de facto, há muitas dificuldades nas famílias, como as há na escola ou na sociedade em geral.

      Boom fim-de-semana.

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  2. É verdade. O ex-maoísta e ex-discípulo do "grande educador" virou capataz dos mangas de alpaca de serviço à deseducação.
    Desgraçadamente, há em tudo isto alguma coerência.

    Abraço

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    1. No fundo, para além da coerência ou da incoerência, NC revelou uma grande fragilidade tanto política como educacional. Não fazia, e não faz, a mínima ideia do que é a escola em Portugal.

      Abraço

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  3. A deseducação, nomeadamente dos pais, não é de agora. Para lá das incoerências políticas, que são muitas e constantes, cabe também às escolas e às direções em particular serem mais firmes com os pais. Nunca como hoje se viram e veem pais e alunos a entrar pela porta dos órgão de gestão adentro, para falar de tudo e de nada. Este ministro nada fez, a não ser perpetuar erros anteriores, mas há demasiado facilitismo também "local". Sou professora e vejo isso amiúde. Mas subscrevo o que está no seu excelente post, claro.

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    1. Estou completamente de acordo, as escolas passaram a ter medo dos pais, e isso é do pior que pode acontecer.

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