sexta-feira, 19 de abril de 2013

Uma deusa terrível e vindicativa


As novas gerações de políticos europeus parecem não ser muito diferentes entre si. Não me estou a referir ao malfadado caso de um político da virtuosa Holanda fascinado com uma habilitação académica que não possuía, ou a história de certa ministra da não menos virtuosa Alemanha acusada de plágio na tese de doutoramento. Coisas parecidas também são conhecidas por cá. Na verdade, não é daí que vem o pior dos males. Verdadeiramente trágica é a abolição do conhecimento profundo da história nacional e mundial do currículo formativo dos políticos. Durante muito tempo, a racionalidade política via a história como o laboratório onde, juntamente com a filosofia política, se aprendia a arte da governação. 

Isto vem a propósito do conflito em torno das reparações de guerra que os alemães parecem não ter pago aos gregos. Contrariamente ao que se pode pensar, o essencial da reivindicação grega não reside no dinheiro, mas na recordação da culpabilidade dos agora virtuosos alemães. A chegada ao poder, na Alemanha, das gerações nascidas depois da guerra está a ter um efeito de amnésia histórica, e os gregos, desesperados pelas imposições do calendário eleitoral e pelo oportunismo económico alemães (financiamento com taxas de juro negativas à custa do desespero do sul da Europa), foram obrigados pela opinião pública a trazer a história para dentro do debate das políticas europeias. 

A substituição da história e, em certa medida, da filosofia política pela economia, uma economia que também ela evacuou a história, tornou a governação num exercício sem memória e sem capacidade para reflectir sobre as consequências das decisões tomadas. Não é que a história e a filosofia política tornem os políticos de direita em políticos de esquerda ou vice-versa. O que acontece é que um profundo conhecimento da história e uma atenção à filosofia política introduz elementos de moderação e de ponderação das consequências das políticas adoptadas. Ao substituir todo esse velho programa formador das elites governativas pela atenção exacerbada à economia política, substituiu-se a experiência de séculos pelo experimentalismo ideológico travestido de ciência económica. As consequências disto estão à vista por toda a Europa, onde milhões desesperam, a economia se retrai, a legitimidade democrática é abalada todos os dias e a malfada história, com o seu cortejo de culpas e horrores, que se expulsou pela porta principal retorna pela porta de serviço, depois de viajar incógnita no monta-cargas. A história é uma deusa terrível e vindicativa.

2 comentários:

  1. Aqueles que se especializaram na arte de cavalgar os povos a toda a sela, serão "cuspidos", mais cedo ou mais tarde, quando esses povos lhes disserem: É a História, estúpidos!
    Bom fim-de-semana

    Abraço

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    1. Não sei, não. A História é uma amante muito infiel.

      Bom fim-de-semana.

      Abraço

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