Rembrandt - Jeremias chora a destruição de Jerusalém (1630)
A burguesia não pode existir sem
revolucionar permanentemente os instrumentos de produção, por conseguinte as
relações de produção, por conseguinte todas as relações sociais. A conservação,
sem alterações, do antigo modo de produção era, pelo contrário, a condição
primeira de existência de todas as anteriores classes industriais. O permanente
revolucionar da produção, o abalar ininterrupto de todas as condições sociais,
a incerteza e o movimento eternos distinguem a época da burguesia de todas as
outras. Todas as relações fixas e enferrujadas, com o seu cortejo de vetustas
representações e concepções, são dissolvidas, todas as recém-formadas
envelhecem antes de poderem ossificar-se (Obras Escolhidas de Marx e
Engels, Tomo I, Edições Avante, pp. 109/10).
Esta leitura de Marx sobre o papel social das classes empresariais
modernas, a que ele dá o singular nome de burguesia, é uma radiografia –
melhor, uma ecografia – da natureza da modernidade. A revolução permanente não
é uma descoberta do marxismo, ou do trotskismo, mas do mundo empresarial
moderno. A dissolução dos costumes e a destruição das tradições são exigências
do modo de produção dito capitalista. A burguesia, usando a nomenclatura
marxiana, não é, por essência, conservadora. Pelo contrário, devido a tudo o
que Marx aí explica, ela tem sempre um papel revolucionário de destruição das
concepções e das representações que o homem faz da realidade. Ela, pela sua
acção social, gera sempre uma espécie de terramoto epistemológico, onde se vê,
lançados por terra, os antigos edifícios do saber e do representar. Esta
essência revolucionária está assente em dois alicerces. O primeiro diz respeito
ao tempo. A necessidade de revolução permanente do modo de produção e dos
mercados gera uma percepção do tempo singular. O tempo social torna-se cada vez
mais rápido e afastado da própria capacidade humana. A aceleração do tempo
produtivo e de consumo torna as pessoas rapidamente obsoletas, incapazes de
acompanhar os ritmos poiéticos e as próprias concepções que lhes subjazem. O
segundo é o niilismo. A verdadeira natureza do desenvolvimento empresarial não
reside na produção, mas na destruição. Para que novos produtos se imponham ou
sejam consumidos, é necessário que os outros sejam abandonados e/ou destruídos.
A capacidade produtiva é apenas um epifenómeno do niilismo presente
no mundo empresarial moderno. A essência é a destruição, o reduzir à
insignificância o produto ontem lançado. Aceleração do tempo e destruição
contínua são, objectivamente, os produtos da modernidade. O diagnóstico de Marx
está absolutamente certo, a terapia proposta é, porém, completamente
inadequada, até porque não há qualquer terapia, a não ser o impossível retorno
às formas de vida conservadoras e aristocráticas. (averomundo, 2009/10/05)
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