Edvard Munch - Jealousy (1895)
A ideia de esfera pública é uma das idealizações mais persistentes da nossa cultura social e política. Seria esse espaço onde os indivíduos - por certo, cidadãos - tomariam a palavra para, num processo de mútuo esclarecimento, fazerem as melhores escolhas, no quadro de um difícil equilíbrio entre o interesse privado e o bem comum. Esta cordata esfera pública, de ascendência iluminista, deveria ser pouco dada ao entusiasmo, para que a divina razão encontrasse, nos processos argumentativos, as melhores razões para suportar as decisões. O que na realidade nos coube em sorte foi uma imensa cacofonia, um ruído cada vez mais insuportável, um conjunto de dramas de faca e alguidar, tudo envolto numa tagarelice inútil, ofensiva e sem fim. Eu sei - e defendo-a - que a liberdade de expressão se manifesta também na possibilidade dos tagarelas não se calarem. Sabendo isso, sabemos também outra coisa, Sabemos que nada de essencial - por muita importância política, económica ou judicial que possa ter - se passa e se diz na esfera pública. A única dúvida que me resta é se a infinita tagarelice da esfera pública ofusca a palavra decisiva e fundamental ou se não há mesmo nada que valha a pena ser dito, e tudo se resuma a um exercício público de ciúmes pela posição do outro, seja esta real ou apenas potencial.
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