Jorge Carreira Maia - Ditosa pátria que... (2007)
Na crónica de hoje no Público, Pacheco Pereira, referindo-se aos últimos seis anos de vida nacional falou em anos de lixo. Ele descreve como é que nestes anos o país se afundou. Isso, porém, não me interessa de momento. Prefiro fixar-me na expressão anos de lixo. Na expressão manifesta-se a ideia de que, nestes anos, triunfou a imundície, uma imundície travestida de pseudo-ideologia. O problema é que o lixo, a imundície já se vinham a acumular há bastante tempo, tornando-se agora visíveis, demasiado visíveis. O problema do lixo é a questão central da vida em Portugal. Ele é anterior e, neste momento, muito mais decisivo do que a querela entre uma visão socialista ou uma visão liberal do Estado e da sociedade. Mais, o lixo, a imundície, com o respectivo cortejo de porcarias e de golpes sujos, ofuscam a própria natureza do debate entre duas concepções diferentes de sociedade. O lixo que entope as instituições não é novo. Tem, podemos dizer, uma natureza quase arqueológica. O lixo nasce da irrelevância do mérito em Portugal e do tipo de relações que, tanto no Estado como nas empresas privadas, organizam a vida dos portugueses. Compadrio, nepotismo, protecção dos amigos e da família, ausência de imparcialidade e toda uma panóplia de vícios derivados, de vícios que a desfaçatez habitual apresenta como virtudes. É esta imundície arcaica que, em momentos de crise como os últimos seis anos, toma um aspecto mais sujo e tem um odor ainda mais nauseabundo. Contudo ela não é específica destes dias ou destes últimos seis anos. A lixeira - ou a piolheira como lhe chamava D. Carlos, para a qual também não estava isento de contributos - tornou-se há muito o habitat social dos portugueses e esgravatar no lixo o modo de vida destes.
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