Albert Rafols Casamada, Civitas Aurea, 1990 |
Um homem avança pela rua molhada. Na cabeça, um chapéu de feltro, como
aqueles que se usavam nos anos trinta do século passado, e uma gabardina,
comprida e de cor indefinida, descai-lhe dos ombros. Não são inseguros os
passos. Pisa a pedra do passeio com firmeza, quase com o ritmo militar. A chuva,
que parou há pouco, continua suspensa de um céu enegrecido. Ao longe, um
aqueduto, envolto em neblina, faz lembrar uma ruína fantasma, daquelas que
habitam as telas de certos pintores românticos. As varandas dos prédios estão
desertas. Uma tabuleta anuncia andares para arrendar, mas o homem não parece
interessado. O seu olhar, sem denotar ânsia, está preso à rua. Um carro passa
lentamente, cruza-se com ele e segue o seu caminho, desaparecendo numa curva.
Outro carro, de um modelo já em desuso, está parado em cima do passeio do lado de
lá da rua. Logo a seguir, um cartaz, encostado a um pilar de um prédio, avisa
para não estacionar de quarta-feira a sábado. O homem continua o caminho, a
gabardina aberta, enfunada pelo vento, faz lembrar uma grande asa. A todo o
momento se espera que o homem levante voo, mas parece bem agarrado à terra. Os
braços vão e vêm, sincronizados com as pernas. Um autocarro aproxima-se, abranda
a marcha e pára. O homem dá uma corrida, a porta abre-se e ele entra. Tira o
chapéu e senta-se. O autocarro retoma o caminho. A chuva, fria e batida pelo
vento, recomeça. Na rua, não se vê ninguém. Pacientes, as varandas esperam os
seus futuros habitantes.
Muito interessante.
ResponderEliminarUm abraço
Obrigado.
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