Julio Gómez Biedma, En otros mundos
Uma das coisas que o êxito político do PAN (Partido das
Pessoas, Animais e Natureza) torna manifesta, apesar de não ser tema de
reflexão, é o fim da cosmovisão cristã nas sociedades actuais. Desde os séculos
XV e XVI que essa cosmovisão está sob cerrado ataque. No entanto, durante muito
tempo, esse ataque concentrou-se apenas na secularização dos grandes valores
cristãos. Nas diversas doutrinas dos direitos humanos, ainda se sente a
influência de uma cultura onde os homens foram criados à imagem e
semelhança de Deus, onde Deus, feito homem, morreu pela salvação da humanidade. Mesmo numa ideologia aparentemente tão antagónica ao cristianismo como o comunismo se ouve o ressoar nítido dos valores cristãos.
Não há nada de mais anticristão do que essa linha de
continuidade “pessoas, animais, natureza” presente na própria designação do PAN. Se o cristianismo mostra alguma coisa,
essa é que o homem não é um ser natural. A permeabilidade da sociedade a
ideologias que não compreendem já uma linha de ruptura entre o homem e as
outras espécies significa que ela deixou já de ser – ou está prestes a deixar
de ser – culturalmente cristã, mesmo que de forma secularizada. A atracção que o PAN exerce não é uma coisa
inócua. Nela revela-se algo de novo. Não se trata de um neopaganismo como, por
vezes, se pensa, pois os deuses pagãos são um sinal da descontinuidade entre o
homem e os outros animais. Trata-se antes de algo que ainda não compreendemos e
muito menos conseguimos avaliar as consequências políticas e civilizacionais.
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