Para retornar à actividade - como está um tempo de preguiça - aqui fica a minha crónica da semana passada no Jornal Torrejano.
Talvez seja dos dias de calor ou da instabilidade do clima, talvez
seja apenas mau olhado, mas Portugal vive um tempo suspenso. Disfarçamos,
olhamos para o lado, assobiamos para o ar. Nada se passa. O Dr. Vítor Gaspar
decidiu ir-se embora, dizendo, depois de arruinar centenas de milhares de
pessoas, que as suas sábias políticas estavam erradas. O Dr. Portas, azougado e
feérico, achou que o tempo se apressava e bateu com a porta, para que ele se
tornasse mais vagaroso. O Sr. Primeiro-Ministro já não sabe para onde se
voltar, nem sabe se quer que o tempo avance rapidamente ou pare. O próprio
Presidente da República decidiu convocar os partidos para suspenderem o tempo.
Mesmo na esquerda, todas aquelas propostas de negociações são formas de
suspender o tempo.
O que está em jogo é uma coisa muito simples, as eleições alemãs. Está
toda a gente à espera de um milagre, que o tempo em Portugal se suspenda, o que
significa que não se tomam decisões aborrecidas, enquanto, sorrateiro e
desavisado, o tempo, na Alemanha, se precipita nos braços das eleições. Desse
amplexo, esperam, suspensos, os portugueses que, rejubilante, a senhora Merkel
fique com melhor feitio. O que temos assistido, nestes últimos tempos, só tem
uma causa: esperar que, liberta do juízo dos cidadãos alemães, gente indisposta
com o pessoal do Sul, a Senhora se apiede de nós e abra uma fresta para
renegociar a dívida e pôr em acção alguns mecanismos de coesão europeia, para
evitar o colapso puro e simples dos países periféricos.
Não vejo outra alternativa à imensa desgraça que se avizinha. Ela
contém, todavia, duas manchas que há que ter em conta. A primeira nódoa diz
respeito à relação entre a vitória eleitoral e a boa disposição de Angela
Merkel. Nada nos garante que, após eleições, ela se torne mais compreensível
com o desespero do Sul. A segunda diz respeito aos responsáveis indígenas. Anda
toda a gente deserta para voltar à sua vidinha, aos negócios do costume. É este
retorno à vidinha que é o principal problema, pois foi essa vidinha que nos
trouxe aqui. Por vidinha entendo não o Estado Social, mas as vaidades de
primeiros-ministros e presidentes de câmara, as auto-estradas sem carros, os
estádios de futebol vazios, o buraco sem fundo da Madeira, os negócios do BPN,
a primazia dos bancos, as Parcerias Público-Privadas e os milhentos negócios
que parasitaram o Estado e as autarquias, e mostraram a natureza das nossas
elites políticas. Podem suspender o tempo, mas o melhor seria suspender o
carácter, ou a falta dele. Foi isso que nos trouxe a este lamaçal e a esta
ignomínia.
É bom voltar a lê-lo.
ResponderEliminar"Das Wunder(?)von Merkel" ainda vai ter as costas
largas...
Abraço
Obrigado, JRD. É verdade, a senhora Merkel ainda vai ter - já tem - as costas muito largas.
EliminarAbraço