sábado, 8 de fevereiro de 2014

Esta história do Miró irrita-me

Joan Miró - Campesino catalán en reposo (1936)

Na polémica sobre a venda ou não dos quadros do pintor Joan Miró - quadros herdados por Portugal na infeliz nacionalização do BPN - há qualquer coisa que me irrita. Não sei bem o que é, mas que me irrita, lá isso irrita. Vejamos se descubro a fonte da irritação. Irrita-me a certeza dos lados em confronto. Esta gente nunca tem dúvidas? Tudo é óbvio no assunto? Os que querem vender, parece que querem vender porque sim e porque não temos dinheiro (uma mentira esfarrapada). Os que não querem vender, não querem porque não e porque aqueles que são a favor da venda são uns labregos. Parece que estamos num cenário já pré-determinado. A esquerda quer conservar, a direita quer vender. Mas isto faz algum sentido? A esquerda não deveria equacionar o problema económico? A direita não deveria meditar sobre a importância do valor artístico dos quadros e a possibilidade deles serem um investimento nacional? O tipo de intervenções proveniente da classe política, bem como dos que lhe servem de eco, à esquerda e à direita, é do mais rasteiro e do mais miserável que se poderia encontrar. Tudo isto irrita-me, mas há uma coisa que ainda me irrita mais. É o ar de sobranceria com que os portugueses são tratados neste caso por alguns comentadores. Na verdade, segundo eles, os portugueses não passam de um bando de gente ignorante e que não deveria abrir a boca sobre o que quer que seja. Então se se tratar de cultura, tirando esses comentadores, ninguém tem o direito, se estiver no seu perfeito juízo, de dizer seja o que for. Nunca ninguém, segundo essa gente, terá ouvido falar de Miró, quanto mais conhecer-lhe a obra. É um despautério a plebe querer falar de pintura e até haver gente que queira que Portugal fique com os malfadados quadros. Tudo isto mostra a doença profunda que se abate sobre o país. Isto irrita-me.

6 comentários:

  1. Também me irrita, embora tenha já lido e ouvido comentadores da Direita à Esquerda colocar a situação como deve ser, de todos os pontos de vista, como ainda ontem os quatro magníficos do Eixo do Mal ou os três magníficos da Quadratura....Não, há quem pense nos Miró sob todas as perspectivas. O que me irrita é este ser o assunto que veio demonstrar de forma clara a forma como o desgoverno pensa sobre tudo o que não seja a equação neoliberal das Finanças. Não, não se trata sequer de números, tenho a certeza de que os quadros duplicariam no mínimo o valor de venda pela Christie's se cá ficassem. Tenho a certeza absoluta. Esta gente nem sequer pensa bem em números, rege-se por uma falta de lógica economicista absurda, desrespeitando tudo e todos, porque sim, porque quer vender, estupidamente, um acervo que todos nós já pagámos e que continuamos a pagar! Ficou bem claro que esta gente «ces gents lá», como dizia o Brel, para além de não pensar nas pessoas (que morram e passem fome» pois não há dinheiro-perfeita mentira!) também não sabe pensar em números. Além disso, o que é gravíssimo, também coloca o país nas ruas da vergonha. Bolas, que prefiro o domínio castelhano! Estes nem defenestrados, só varridos por completo do universo.

    ResponderEliminar
    Respostas
    1. A primeira coisa que o governo deveria ter feito era cumprir a lei do património e ter classificado as obras. Parece que houve expedientes - mas não sei nada desses assuntos - para despachar o assunto a grande velocidade e não pensar muito no caso. Apesar de alguns comentadores terem colocado a questão como deve ser - não vi esses programas - a verdade é que há uma tonalidade bastante desagradável em muita gente. Fundamentalmente, há pouco, ou nenhum, pensamento.

      Eliminar
  2. :) Por isso mesmo, passa-me ao lado. :) Ainda por cima, nem sequer acho que tenho conhecimento suficiente para falar de um modo ou de outro. Mas lá está, tudo tem de ser aproveitado politicamente... brrrrr isso é mesmo irritante :)
    Bom domingo, Jorge.

    ResponderEliminar
    Respostas
    1. Que seja aproveitado politicamente, isso é o menos. Ao menos que o aproveitamento político fosse fundado em sólidas análises de política cultural e de política financeira.

      Bom domingo, Faty

      Eliminar
  3. Sobre o Miró gostei de ouvir o Berardo e o Cavaco.
    Um abraço

    ResponderEliminar

Nota: só um membro deste blogue pode publicar um comentário.