Portugal, com a crise da dívida soberana e a actual governação,
entrou, com o atraso que é habitual num país periférico, na era thatcheriana da política. Até aqui, tinha
convivido com a vitória do neoliberalismo, mas tentava preservar algumas das
conquistas sociais e civilizacionais que tinham chegado ao país muito tarde,
depois do 25 de Abril e da adesão à CEE. Conquistas essas que a senhora
Thatcher tinha mandado, pura e simplesmente, para o caixote do lixo. Para nós
percebermos as consequências daquilo onde estamos metidos vale a pena citar uma
frase célebre da ex-primeira-ministra britânica publicada em 1993: Não existe essa coisa da sociedade, o que há
e sempre haverá são indivíduos.
Esta frase, que se tornou o lema dos poderes políticos que governam
para os mercados, tem consequências terríveis. A principal é a duma ideologia
que nega a existência do bem comum. Se não há sociedade, não há, como costuma
dizer um amigo meu, nenhum bem comum que se sobreponha aos interesses
particulares. Por isso, tudo pode e deve ser privatizado, desde a saúde à água,
desde as infra-estruturas da electricidade às escolas. É isto que estamos a
descobrir em Portugal. A segunda consequência prende-se com as antigas redes de
solidariedade que suportavam a comunidade e a defesa do bem comum. Como o bem
comum não existe, então não faz sentido a existência dessas redes de
solidariedade, que vão dos sindicatos às estruturas governativas de protecção
social. Desde há muitos anos que assistimos ao sistemático e paulatino
desmantelamento dessas redes. Só os indivíduos existem, só os seus interesses
particulares e egoístas contam.
É evidente que esta ideologia extremista fundada num individualismo
radical não se impõe de um dia para o outro. Precisa de lutar e destruir as
velhas tradições da humanidade. O homem sempre foi compreendido como um animal
que vive em sociedade. A perspectiva neoliberal da senhora Thatcher – agora
tornada dogma da direita portuguesa – entra em contradição com os hábitos da
humanidade e a forma como os homens têm afirmado a sua vida. Nunca a não ser
nos nossos dias alguém se teria lembrado de fazer política como se a sociedade
não existisse. O que vamos assistir em Portugal é a um acelerar do processo de
destruição dos laços sociais, das redes comunitárias, da sociedade, numa
palavra. Em nome de quê e para quê? Em nome do indivíduo e dos seus interesses
particulares e egoístas. Para que alguns indivíduos, socialmente fortes e bem
colocados, possam fazer dos outros indivíduos, mais frágeis, isolados e sem
defesas sociais, o pasto para as suas actividades de rapina.
Se o Tatcherismo pré-alzheimer era cruel e impiedoso, este ainda é pior, não sabe para onde vai.
ResponderEliminarBom fim-de-semana
Abraço
Não saber para onde se vai é a consequência lógica da desregulação e da crença, transformada em dogma de fé, na mão invisível.
EliminarBom fim-de-semana.
Abraço