Lewis Hine - Great Depression - man lying down on pier, New York City docks (1935)
Consciência, dizes tu? És demasiado pobre para manteres a consciência. (Knut Hamsun, Fome)
Voltemos aos lugares-comuns para parafrasear Hölderlin: para que serve a literatura em tempos de indigência? Antes de mais, haverá tempos que não sejam de indigência? Não é o tempo a casa dos indigentes, isto é, de todos nós? Não nos desviemos, porém, e respondamos à questão de Hölderlin com outro lugar-comum: a literatura serve para perturbar e inquietar. Perturbar e inquietar significam dar que pensar. A literatura dá que pensar. É o que faz a frase de Knut Hamsun no romance Fome. Ela mostra-nos, inopinadamente, que a consciência moral não tem um valor absoluto. Está ligada a um nível mínimo de propriedade, abaixo do qual os homens não têm direito sequer à consciência moral ou direito à presunção de a possuir. Ao manifestar o trágico da existência, a literatura explora os estratos que compõe os nossos valores e desafia o pensamento, confrontando-o com o mundo da vida. O sujeito cartesiano, despido de corpo - logo, despido de fome - pode, nas suas diversas metamorfoses - nomeadamente, na kantiana - arvorar valores morais absolutos, mas a personagem literária não habita o céu puro do pensamento. Ela tem mundo, tem corpo e tem fome e é nesta terra impura que a literatura nos mostra os valores e nos obriga a pensá-los.
Disse Óscar Lopes: O cérebro social é que tem de ser refeito.
ResponderEliminarMas não sei se no actual tempo de indigência social essa mudança, que inclui a literatura, é possível.
Um abraço
O meu problema é outro: será, se exceptuarmos uma mudança genética na espécie, o cérebro social refazível em algum tempo?
EliminarAbraço