Oskar Kokoschka - Aquilo por que lutamos (1943)
Quando oiço a expressão aquilo por que lutamos nunca consigo conter um sorriso. É mais forte do que eu. Eu sei que há causas justas pelas quais os homens se devem bater. Eu sei que há muitas pessoas que dão as suas vidas por essas causas. Eu próprio não fui nem sou indiferente a certas causas, por algumas das quais me bati e, eventualmente, ainda me bato. Há todavia qualquer coisa nisso tudo que faz nascer em mim um profundo cepticismo por todas as causas, as minhas, em primeiro lugar, e as dos outros, de seguida. Se me interrogo o motivo de tal cepticismo a única coisa que encontro é um sentimento de desproporção entre a natureza da causa e o ardor que ela mobiliza e aquilo que a sua realização traz consigo. Um exemplo. Olhemos para a declaração dos direitos do homem ou para a consigna liberdade, igualdade e fraternidade trazidas pela Revolução Francesa. Parecem-me boas causas, mas interrogo-me se seriam necessárias tantas mortes e um intenso exercício do terror. É muito provável que a realização de certas causas moralmente boas implique a violência que toda a luta traz consigo. Para muitos, a bondade da causa (o fim a atingir) justifica os meios utilizados, onde se incluem os crimes mais bárbaros. O que me falta a mim, e daí o meu sorriso céptico, é esta capacidade de produzir boa consciência. A violência não deixa de ser violência e um crime não deixa de ser um crime, independentemente das razões pelas quais são praticados. Eu sei que uma consciência céptica não é a melhor coisa para ostentar no ardor da luta. Se, porém, o cepticismo surgisse na cabeça de todos os ardentes lutadores, talvez as grandes causas tivessem atrás de si um rasto de sangue e de patifaria bem menor. Talvez.
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