Matthias Grünewald - Christ on the Cross, detail from the
Central Crucifixion Panel of the Isenheim Altarpiece (daqui)
Sexta-feira de Paixão. Retorno a Grünewald, neste dia, para rememorar um símbolo decisivo do nosso modo de compreender o mundo e da nossa civilização. Dos múltiplos significados da morte de Cristo retenho apenas um. Com a crucificação, a violência do homem sobre o homem tornou-se ilegítima. Na economia do cristianismo, a morte do seu fundador é a morte que concentrou em si todas as mortas e todas as violências. Foi a última morte legítima. A partir dela, todas as mortes e todos os actos de violência se tornaram ilegítimos. Mas os cristãos não têm sido, também eles, violentos? As Igrejas que o tomam como princípio originário não praticaram e não praticam, também elas, a violência? Sim, praticaram, praticam e, como são organizações humanas, praticarão. Só que essa violência, essa inclinação homicida, é contrária à lei que o Cristo trouxe e que se consubstancia no amor ao próximo. A morte de Cristo representa a abolição de todo e qualquer sacrifício humano. Não da sua abolição efectiva, mas da sua deslegitimação. Os homens são seres violentos. É essa a sua natureza. Essa violência, porém, já não pode manifestar-se como um bem, seja qual for o princípio racional ou não que a pretenda justificar. Ela é apenas uma faceta do mal. A morte de Cristo na cruz é o preço pago pela imoralização da violência, de qualquer violência, do homem sobre o seu irmão. Nada justifica Caim.
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