Tornou-se, nos últimos tempos, alvo de chacota pública o afã com que o
Presidente da República (PR) distribui condecorações. Uma condecoração é sempre
o reconhecimento público de um mérito. Não vou discutir a virtude daqueles que
foram contemplados pela enxurrada de medalhas que brotou em Belém. Mais
interessante que isso é compreender a mensagem subliminar que o actual PR – ou
o seu inconsciente – nos está a enviar.
A generosidade com que reconhece, através da condecoração, inúmeros
membros da sociedade portuguesa é o sintoma do desejo que nele habita de, ao
sair da presidência, ser reconhecido e amado pelos portugueses. A situação
política de Cavaco Silva é desastrosa. O político mais vitorioso, que mais
poder teve para conformar os destinos do país, sai de Belém execrado à esquerda,
olhado com condescendência à direita, completamente isolado.
Poderíamos dizer que a realidade política e a malevolência humana destrataram
Cavaco Silva. Faltaríamos, porém, à verdade. Cavaco Silva está a colher o que
semeou em toda a sua longa e vitoriosa vida política. A semente foi a falsa
máscara que criou. Explorando a animosidade dos portugueses perante as elites
políticas, sempre fez questão de sublinhar que ele não era um político, que não
se confundia com os outros, que a sua palavra era o voz da ciência e do saber e
não a dos interesses em conflito. Esta mentira funciona enquanto há muito
dinheiro para distribuir.
Cavaco sente que o país deseja que ele se vá rapidamente. Esta sensação
de abandono é intensificada por uma humilhação política impensável em final de
carreira. Não apenas teve de dar poder a um governo que ele não queria e a que
se opôs para além do razoável, como esse governo é apoiado por aqueles que ele
declarou como párias da democracia portuguesa. O que resta a um PR que acaba
derrotado em tudo o que é essencial? Distribuir condecorações a eito, como se
assim dissesse aos portugueses que ele – ele acima de todos os outros – merece
o que agora não lhe dão. Um acto de compensação, uma súplica de reconhecimento.
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