Quando uma palavra utilizada no discurso político como
metáfora se torna um lugar comum, devemos desconfiar de que ela não quer dizer
rigorosamente nada. A vida social está cheia de palavras que são uma referência
ao vazio. Por exemplo, empreendedorismo. De tão utilizada como mezinha para
curar os males de que padece a vida económica, chegou ao ponto de não querer
dizer absolutamente nada, embora muita gente faça cursos de empreendedorismo,
dos quais, por norma, poucos ou nenhuns empreendedores resultam. A metáfora a
que me referia é, porém, bazuca. É aplicada aos fundos europeus gigantescos que
irão ser mobilizados para enfrentar os danos colaterais da pandemia. Como o
empreendedorismo seria a atitude que viria resolver o problema do emprego, a
bazuca será a salvação de economias debilitadas pelos confinamentos.
Uma bazuca é uma arma de guerra para fazer explodir alvos inimigos. Ora o alvo do dinheiro da União é, directa ou indirectamente, a economia. A ideia será fazê-la explodir? Imaginemos, todavia, que a bazuca se dirige contra uma recessão económica e a subsequente liturgia da austeridade. Não será a metáfora nem mais elegante nem a com maior poder descritivo. Apesar disso, ela não deixa de fazer salivar muita gente. E é esta salivação que me aborrece. Compreendo que a União Europeia tenha o dever de ter uma estratégia para os seus Estados membros. O sórdido da questão diz respeito à forma como em Portugal há muita gente habituada a viver à custa dos fundos europeus. Estes têm ajudada a disfarçar a nossa pobreza endémica e a bazuca irá, mais uma vez, mascarar essa indigência nacional.
Instalou-se uma cultura de desprezo pelo esforço e pela autonomia do país. Autonomia não significa voltar ao velho soberanismo nacionalista. Significa que através do nosso esforço cuidamos de nós. Os fundos da União Europeia – onde se incluem os da bazuca – deveriam ser entendidos como uma ajuda a que desenvolvêssemos a nossa autonomia, através de um esforço patriótico persistente, que dispensasse a necessidade de mais ajudas. Não parece ser esse o entendimento geral. A ideia parece ser a de vivermos de ajudas crónicas dos outros países. É por isso que a palavra bazuca faz salivar muita gente. São as novas especiarias da Índia, o novo ouro do Brasil. Quando era criança, também havia bazucas, eram umas pastilhas elásticas chamadas precisamente bazooka. Eram óptimas para fazer um balão enorme que rebentava e de lá apenas saía ar. Temo muito que a bazuca europeia, nas mãos nacionais, não passe de uma bazooka.
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