A minha crónica semanal no Jornal Torrejano.
Eusébio chegou a Lisboa tinha eu quatro anos, e era, imagine-se, um
fervoroso adepto encarnado. Nascido no seio de uma família, pelo lado paterno,
de benfiquistas, o Benfica está presente em mim quase desde os primeiros
momentos de vida. Havia, por essa altura, nos finais de 1960, nomes que eu já
conhecia. Águas, Costa Pereira, Coluna, Santana, Cavém. Foram os meus primeiros
heróis. O gosto pelo futebol ampliou-se e consolidou-se talvez um pouco antes
da entrada na escola primária, em Outubro de 1962. Como? Com as colecções de
cromos da bola. Para quem gostasse de futebol – e naquele tempo a maioria dos
rapazes gostava – coleccionar cromos de futebolistas era um dever, uma espécie
de iniciação que permitia a entrada no universo dos rapazes.
Numa dessas colecções – uma em que os jogadores eram retratados a meio
corpo com o emblema do clube por trás –, o Eusébio aparecia por três vezes.
Como jogador do Benfica, da Selecção Nacional e da Selecção Militar. Estávamos
em 62 ou 63 e isso diz tudo o que o Eusébio era naquela altura. Cresci a ouvir
e a ler os feitos do Eusébio. Ouvir, mais do que a ver. Ver via-se na
televisão, mas as transmissões de jogos eram raridades. Viam-se resumos, ao
domingo à noite, e isso era um acontecimento. Ouvia, como Portugal inteiro
ouvia, os relatos dos jogos e, cedo, comecei a ler os jornais desportivos. Para
a maioria de nós dizer que vimos jogar o Eusébio significa apenas que vimos uns
quantos jogos na televisão, muitos resumos e ouvimos relatos sem fim e lemos
inumeráveis crónicas nos jornais. Um jogo de futebol em Lisboa era, naquele
tempo, um bem escasso. Mas, claro, não havia semana que não víssemos, na
imaginação que o relato e a crónica incendiavam, o Eusébio jogar. E víamos que
era o melhor.
Para além do prazer das vitórias do Benfica e da Selecção, devo ao
Eusébio e ao futebol daquela época outra coisa. Uma certa ideia de persistência
e de continuidade no tempo. Entre os meus 4 e 18 anos, Eusébio foi a figura
central do Benfica, uma presença contínua na minha imaginação. Não apenas ele,
não apenas jogadores do Benfica. As equipas mantinham a mesma estrutura durante
anos e anos, e aqueles jogadores, mesmo os adversários, tornavam-se familiares,
gente com quem vivíamos e que, sem nunca os termos visto, os víamos todas as
semanas, vestidos de vermelho, de verde, de azul... Tudo era, no futebol
daquele tempo, mais lento e mais duradouro. Apenas Eusébio era demasiado
rápido. Por isso, as bolas entravam na baliza e o seu nome no nosso coração.
Perdi uma parte da minha infância.
Alguns anos antes de Eusébio chegar, fui do berço para o "Campo Grande" levado pelo meu Pai e aprendi a magia de ser benfiquista.
ResponderEliminarDecorrido algum tempo, ele disse-me com um brilho nos olhos: Prepara-te porque vamos ter o melhor jogador de sempre.
E assim foi, chegou o grande Eusébio que, além de me ter proporcionado momentos de grande emoção, conseguiu sublimar em mim a infinitude do afecto indestrutível que tenho pelo Glorioso.
Também eu perdi parte de mim quando deixei cair uma lágrima rebelde...
Obrigado pelo poste.
Bom fim-de-semana
Um abraço
Teria gostado de escrever este post mais tarde, bem mais tarde, mas as coisas são como são.
EliminarBom fim-de-semana
Abraço
Um texto muito bonito e sincero sem cair na desmesura dos media...
ResponderEliminarApesar de Eusébio ter sido um jogador desmesurado, os média, com a habitual desvergonha, aproveitaram e entregaram-se ao exagero.
EliminarO mais vergonhoso ainda é o aproveitamento político da morte de um homem bom e excelente jogador. «Parecem abutres», dizia há pouco alguém...
ResponderEliminarAs televisões, mas não só, alimentam-se da morte. Nem sequer épreciso que seja alguém importante. As horas que vendem quando há um desastre. Então se é no mar e os corpos estão desaparecidos, é um verdadeiro paraíso para os noticiários. Enfim...
EliminarUm belíssimo texto de nostálgica homenagem.
ResponderEliminarMuito obrigado.
Eliminar