A minha crónica no Jornal Torrejano.
Por motivos profissionais estou a fazer formação na área da
Filosofia da Religião. As reorientações que o programa de Filosofia do ensino
secundário está a sofrer implicam, entre outras coisas, que a área dos valores
religiosos se torne obrigatória e não seja, como até aqui, uma opção, a qual,
por norma, é preterida pela dos valores estéticos. Vão ser as duas
obrigatórias. Faz sentido, no contexto em que vivemos, tornar obrigatória, no
ensino secundário, uma reflexão filosófica sobre a religião? Do ponto de vista
tanto da formação do indivíduo como do cidadão, e é este que aqui interessa,
faz todo o sentido.
A religião tornou-se um fenómeno político global. Confinada
durante muito tempo, no Ocidente, à consciência do indivíduo, com o advento do
Islão na esfera política mundial, tendo-se tornado um dos grandes actores geopolíticos,
a questão religiosa deixou de poder ser vista como um mero problema pessoal.
Concomitante a isto, está a relação – não poucas vezes conflituosa –, no mesmo
território, entre populações secularizadas e de práticas religiosas meramente
convencionais e populações de fortes convicções, onde a identidade pessoal é
construída a partir da fé professada. Para crentes, agnósticos e ateus, a
questão religiosa está de volta e deve ser pensada.
O contributo que a Filosofia, no ensino secundário, pode
fornecer no âmbito deste assunto é muito específico. Não pode visar nem a uma
catequese nem a uma contra-catequese. Isso é um problema que as diversas
Igrejas e movimentos religiosos ou anti-religiosos devem fazer no respectivo
âmbito de acção. A Filosofia visa antes fornecer um conjunto de ferramentas
críticas, para que os alunos possam avaliar o problema religioso que o actual
estado do mundo nos impõe, assim como as suas convicções pessoais, sejam elas
quais forem.
Do ponto de vista político, esta missão da Filosofia é da
mais alta importância. As questões religiosas, ao lidarem com a relação do
homem com o sagrado, têm um enorme poder para desencadear paixões mortíferas.
Introduzir na esfera da crença a reflexão racional e crítica não serve para
destruir as crenças, para fazer conversões ou promover apostasias. Serve para
diminuir as paixões, para que o fanatismo dê lugar ao debate sereno e à análise
crítica rigorosa. Trazer a Filosofia da Religião para a formação dos alunos é
um contributo para que a cidadania futura se torne melhor, mais racional, mais
crítica e menos permeável ao vírus do fanatismo e aos rituais da violência.
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