Ivonne Sánchez Barea - Islam (1999)
Num outro mundo que não o nosso, seria profundamente enriquecedor para
um país a existência de múltiplas comunidades religiosas e culturais a viverem lado a lado, em perfeito estado de comunicação e respeito mútuo. Para tal,
porém, seria necessário que as partes reconhecessem às outras o pleno direito
de cidade e aceitassem um conjunto de direitos tidos como universais, os quais
constituiriam a plataforma mínima de entendimento. O problema não está no facto
de alguém ir à igreja, à sinagoga, à mesquita ou a templo nenhum. O problema
está se um pai – seja de que religião e cultura for – acha por bem ter o
direito de impor um casamento a uma filha menor ou maior, se um homem se julga
proprietário da respectiva mulher, se alguém pensa que o facto de se não crer
numa dada religião é motivo para se ser considerado sub-humano, ou que o
abandono de uma religião deve ser punido com a morte.
Pior, mas muito pior, é se existem grupos organizados que têm por fim
combater os infiéis (como no caso do ataque
ao Museu Judaico belga) e, num futuro mais ou menos próximo, visam a
conquista do poder e impor a sua religião e a sua visão do mundo. Numa altura
em que a Europa ocidental vive uma profunda crise de identidade, será muito
importante não tergiversar com os valores centrais da laicidade do Estado e da
liberdade religiosa. Esta deve ser escrupulosamente respeitada. Mas apenas até ao momento em
que, por motivos religiosos, se pretenda destruir o Estado laico, pôr em causa
os direitos básicos dos indivíduos, nomeadamente a sua liberdade pessoal e
religiosa, onde se inclui o direito à descrença, à apostasia e à conversão.
Nestas ocasiões, o Estado deve ser rigoroso (como parece estar
a acontecer em alguns países europeus) e não exibir qualquer tipo de
complacência com ataques a estes valores centrais. Deve, por outro lado, e
contra uma visão liberal de abstenção nos assuntos da sociedade civil, ter um
papel activo no fomento do diálogo republicano entre as diversas comunidades
presentes numa sociedade. Deve fazê-lo, por muito que isso incomode certas
consciências, como portador de uma racionalidade que ultrapassa as razões
estratégicas das diversas partes presentes no corpo social. Uma acção firme,
por parte do Estado, nessa direcção pode impedir o desenvolvimento daquilo que é já uma realidade,
a existência de forças políticas extremistas e xenófobas, que vêm no abstencionismo
liberal uma oportunidade para explorar o ódio e responder ao radicalismo com
radicalismo de outro matiz. O Estado não pode demitir-se na construção da
comunidade, nem do esforço republicano de diálogo e negociação entre as
diferenças.
As intolerâncias religiosas e o que se faz em nome de Deus, seja ele qual for, só não é um retrocesso civilizacional, porque nunca foi de outra maneira
ResponderEliminarOs estados laicos andam distraídos com outros ícones e passam ao lado..
Abraço
O pior ainda é outra coisa. Estados laicos ocidentais a apoiar coisas como os neo-nazis na Ucrânia ou os jihadistas no mundo árabe.
EliminarAbraço