Nicanor Piñole - Subindo a Montanha (1918)
O que pratica a via
diminui a cada dia.
Diminuindo, chega ao
não-agir.
Ao não agir, nada há
que não se faça.
Lao
Tse, Tao Te King, XLVIII
Quando era novo, levado pela
inconstância do espírito e pela ordem do mundo, ele pensou que o essencial
seria, a cada dia, aumentar, tornar-se cada vez maior, afirmar a excelência que
a vida teria posto à sua disposição. Como qualquer outro, via na acção o
caminho para a grandeza. Muitas são as formas como essa grandeza chama os
homens e os leva para um caminho que ela mesma oculta aos olhos daqueles que
seduz. Uns abandonam o mundo e as suas ilusões para, escondidos em algum
cenóbio e em nome de um Deus, procurarem a glória da sua grandeza. Outros
mergulham no mar agitado da acção e, falando em nome dos pobres e dos
humilhados, alimentam, no mais íntimo e obscuro de si mesmos, a esperança de se
tornarem heróis. A grandeza é um demónio vicioso e astuto.
Nem todos, porém, trazem no centro de si
o imperativo do crescimento. Se nos primeiros tempos, o entusiasmo ainda os
atira para o fulgor da busca da glória, logo um mal-estar toma conta deles e um
vazio cresce no fundo da alma. Uma voz – sim, uma estranha voz inarticulada –
começa a sussurrar. Se não lhe dão ouvidos, ela grita, distribuindo imperativos
a cada hora que passa. Não, não coloca questões, não se dirige à razão, mas
fala para os instintos e, através deles, para cada célula do corpo. Muda de
caminho! Mas eu quero crescer, responde o interpelado. Diminui! Torna-te
pequeno! É isso que espero de ti.
Não posso trair expectativas e
esperanças, pensou. Como abandonar esse peso, o sonho da grandeza, e frustrar
os que precisam de mim? Talvez por isso Jacob tenha, um dia, lutado com o anjo.
Os dias, porém, traziam cada um a sua humilhação e, com a passagem dos anos, da
grandeza esperada já pouco restava. O caminho tinha começado numa estranha
encruzilhada, onde ele queria e não queria entrar pela senda que era a sua. Os
seus planos dissolviam-se na areia e, em muitas noites, pensou que era ainda
menos que o mais ínfimo grão de areia. Contra vontade, começou a diminuir. Quando
chegava a madrugada, ainda o sonho de glória o animava, mas a noite quase o
reconciliava com a sua crescente pequenez. Exausto pelo conflito, abre a mão de
todos os sonhos e, perante a montanha mais elevada, grita: venceste, montanha.
Apenas quero diminuir, ser, a cada dia que passa, mais pequeno e esperar que
venha a morte e o meu nome seja esquecido. Nessa noite não foi atormentado
pelos sonhos. Quando o dia chegou tudo era novo e estava no lugar que era o
seu.
Não acredito que um pregador possa ser revolucionário, mas cada vez tenho mais dúvidas do contrário.
ResponderEliminarDeve ser por isso que o novo regressa ao antigo.
Boa semana e com menos calor.
Um abraço
Talvez o novo não regresse ao antigo, mas acaba sempre por ter a um sítio onde ninguém quer ir.
EliminarTambém dispenso o calor. Boa semana.
Abraço