O Jornal Torrejano (JT), nesta segunda encarnação, a de
Setembro de 1994, talvez fosse uma iniciativa já anacrónica. Isso, porém,
ninguém o imaginaria. Nasceu numa época em que muitos ainda acreditavam na
existência de uma esfera pública burguesa, isto é, civil e interessada nos
problemas da comunidade, onde se teciam e terçavam argumentos sobre o bem comum.
O JT vinha para alargar a esfera pública concelhia, retirá-la da modorra em que
vivia há largas décadas. Quis pluralizar a opinião política local e centrá-la
no debate do que fosse relevante. No fundo, era um projecto de jornalismo
político ao nível concelhio, e isso fazia a diferença relativamente à situação.
Nasceu também num tempo em que os jornais eram de papel, coisas materiais e
sólidas. As pessoas compravam-nos, sentavam-se numa esplanada e liam-nos,
enquanto tomavam café.
Seja no tempo longo da História, seja no tempo curto de uma
vida, a verdade é que em 25 anos as coisas mudaram muito. A esfera pública
burguesa explodiu. Foi dinamitada pela internet
e pelas redes sociais. Com a explosão confundiram-se o público e o privado, a
própria intimidade, último reduto do privado, tornou-se pública. O debate
político foi substituído por campanhas de hooligans
em que as partes se bombardeiam com mentiras e frases ocas. Não se trata de
pensar e debater, trata-se de sentir e aniquilar simbolicamente, por enquanto,
os oponentes. Por fim, a solidez dos jornais dada pelo papel está a evolar-se
com a sua desmaterialização no ciberespaço. O JT foi-se adaptando e tentando
andar sobre as águas, evitando o pior que os tempos trouxeram. Ter sobrevivido
não foi pequeno feito.
Podemos sempre fazer um exercício de projecção. O que poderá
ser o JT daqui a 25 anos, caso ainda exista? Duas coisas parecem claras, talvez
as únicas. Será completamente desmaterializado. Será lido em dispositivos
electrónicos como já sucede em muitos casos agora. Também a velha esfera
pública burguesa, com os seus rituais de racionalidade, que animou o projecto em
1994, não voltará. Todo o resto é uma incógnita. O facto de ser uma incógnita é
uma vantagem, pois obrigará o JT a repensar-se, a recriar-se, a tirar partido
da contínua transformação tecnológica. Obrigá-lo-á a olhar para a sociedade e
encontrar os destinatários que, através dele, renovarão o vínculo que os ligará
a um destino comum. O melhor presente que o JT pode ter neste aniversário é o
espaço fechado do futuro. Esse será o campo que terá de desbravar, o que lhe
exigirá um repensar-se e um redesenhar-se constantes.
[A minha crónica na Revista dos 25 anos do Jornal Torrejano]
Muito interessante.
ResponderEliminarUm abraço
Obrigado.
EliminarAbraço