Hyacinthe
Rigaud - Portrait of Jacques-Bénigne Bossuet (1702)
Terão alguma vez os tiranos
inventado torturas mais insuportáveis que aquelas que os prazeres fazem sofrer
aos que se abandonam a eles? Eles trouxeram ao mundo males desconhecido ao
género humano, e os médicos ensinam, a partir de uma perspectiva comum, que
estas funestas complicações de sintomas e de doenças que desconcertam a sua
arte, confundem as suas experiências, desmentem tantas vezes os antigos
aforismas, têm a sua origem nos prazeres. [J-B Bossuet, Sermon contre l'amour des plaisirs, I.º
point]
Eis o progresso. Desde a condenação do prazer visto como tortura,
devido à insuportabilidade de um desejo nunca saciado, até aos actuais programas
políticos da educação para o prazer vão cerca de três séculos. A grande
diferença, curiosamente, é que Bossuet sermoneava desta forma perante Luís XIV
e a sua corte, como forma de tornar os poderosos mais contidos, enquanto
hoje é o poder político que evangeliza a população para o culto do prazer.
Restará, contudo, fazer esta estranha pergunta: o que ganham as elites
políticas com esta evangelização? O que pretendem elas? Bossuet diria que
pretendem abrir uma espécie de caixa de Pandora e disseminar os males pelo mundo,
ao mesmo tempo que submetem as populações à tortura mais insuportável, a do
desejo nunca saciado (curiosamente, não é este desejo que funda a sociedade de
consumo?). Mas Bossuet não passava de um teórico do absolutismo, adversário da
democracia. (averomundo, 15/11/2009)
Sem comentários:
Enviar um comentário
Nota: só um membro deste blogue pode publicar um comentário.