Edvard Munch - Golgotha (1900)
Há certas coincidências que, se meditadas longamente, acabam por revelar que a coincidência é mais do que isso, que nela se inscreve um sentido excessivo, o qual necessita dessa coincidência para suportar tudo o que quer sinalizar. É o caso da crucificação de Cristo no Golgotha, no lugar da caveira. A morte dá-se no lugar onde ela já está representada (na ideia de caveira), como se houvesse necessidade de intensificar essa experiência até ao paroxismo. Este transbordar de sentido da morte é o outro lado da experiência humana. Todos sabemos que haveremos de morrer, mas esse saber completo e inquestionável nunca conseguiu explicar-nos o sentido dessa morte. O que vemos no episódio do Golgotha é o desejo. O desejo de encontrar um sentido para a nossa finitude. É o desejo que conduz à sobre-representação do objecto temido, mas também é ele que abre a pista para a procura de sentido. A morte no Golgotha, isto é, a morte, só tem sentido como abertura para a vida, o que na narrativa evangélica é dado pela ressurreição. A sobre-representação da morte, na crucificação de Cristo no calvário, é o negativo do intenso desejo com que vida irrompe e impede que, por mais que a racionalizemos, a morte tenha sentido para a humanidade.
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