A minha crónica semanal no Jornal Torrejano.
A política grega continua a trazer lições inusitadas. Na passada
terça-feira o jornal francês Le Monde
noticiava o apoio de Marine Le Pen, a líder da Front National (extrema-direita francesa), ao Syriza (esquerda radical grega, aparentado vagamente com o nosso
equívoco e decadente Bloco de Esquerda). O Syriza
continua à frente nas sondagens para as eleições de domingo, e Marine Le Pen
afirmou que gostaria de ver o partido de Alexis Tsipras vencer as eleições.
Podemos simplificar o problema dizendo que os extremos se aproximam e,
como seria este o caso, acabam por se tocar e confundir. Será isso que os
partidos tradicionais gregos, ligados à governação dos últimos decénios,
afirmarão, numa tentativa desesperada de conseguir a vitória nas eleições de
domingo. Isso, porém, faz parte do jogo partidário, e não passa de uma ilusão,
ilusão que acaba por esconder a natureza do que se está a passar na Europa.
Em primeiro lugar, a divisão tradicional entre direita e esquerda, com
o fim da experiência comunista no leste da Europa, começou a abrir fissuras e
ameaça desmoronar-se. Não no sentido pretendido pela direita autoritária
tradicional ou mesmo liberal, as quais argumentavam que a divisão entre esquerda
e direita abria um conflito no todo social, na unidade nacional. O desmoronar a
que estamos a assistir não nos conduz à unidade, antes pelo contrário. O que
acontece é que a velha, simples e muito conveniente divisão entre esquerda e
direita explodiu em múltiplas divisões, as quais já não seguem, em muitos
casos, a divisão tradicional. O mundo tornou-se muito mais complexo e a
realidade política acompanhou-o, começando a dinamitar as velhas categorias e
baralhando a forma de compreender o fenómeno político.
Em segundo lugar, a política europeia, pelo radicalismo liberal e pelo
fanatismo austeritário, teve o condão de abrir espaços onde esquerdas e
direitas fora do arco da governação encontraram um terreno fértil para
encontrar eleitorado. A destruição, na Europa, do pacto social-democrata e do
Estado social, aliada à corrupção crescente na esfera do poder, gerou a
possibilidade de organizações políticas antagónicas reivindicarem medidas e
políticas semelhantes. Na verdade, o crescimento da direita nacionalista francesa
ou da esquerda radical grega são o sintoma de uma mesma nostalgia, a nostalgia
das antigas políticas europeias, onde o desenvolvimento económico, ao contrário
de hoje em dia, tornava todos mais ricos. Lentamente, iremos assistir à
explosão das antigas divisões e descobrir, estupefactos, novas e inesperadas
alianças. Já não estamos no século XIX nem no XX. Os tempos mudaram.
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