sábado, 24 de janeiro de 2015

Casas senhoriais e questões regionais


Agora que alguém se lembrou de chamar a regionalização para o debate político, reponho um post do meu antigo blogue averomundo sobre o problema.

Estes aspectos, a par de uma crescente dependência face à Coroa e do papel desta na estruturação e na hierarquização da nobreza, permitem compreender por que não surgiram, até ao início do século XV, verdadeiras Casas senhoriais, dotadas de um sólido e estável património fundiário e de uma enraizada e duradoura implantação local regional. Mesmo quando se constituíram, as grandes Casas senhoriais portuguesas foram directamente criadas pela Coroa e encabeçadas por membros da família real, como ocorreu com a que viria a ser a Casa de Bragança ou com os ducados de Viseu e de Coimbra. [Bernardo Vasconcelos e Sousa, (2009). "Idade Média", in Rui Ramos, Bernardo Vasconcelos e Sousa e Nuno Gonçalo Monteiro, História de Portugal. Lisboa: A Esfera dos Livros, pp. 97]

Um pouco de história dos poderes regionais. É como se esses poderes não possuíssem uma tradição no país. Como todo o resto, as próprias casas senhoriais são uma criação do poder central, neste caso do poder régio. Quando o poder político achou necessário criou-as, mas pouco ou nada se coibiu de interferir na sua vida e, sempre que achou necessário, de ameaçar os seus detentores. Não apenas o reino e depois a nação com o seu Estado são uma criação da elite política, como os fracos poderes regionais não representam nenhuma especificidade própria.

Agora que, parece, vai tornar a debater-se a regionalização, convém perceber a longa e espessa tradição histórica do país. Um país que é a invenção de um pequeno grupo de agentes políticos, com uma dimensão diminuta e parcos recursos naturais, sempre sentiu os poderes regionais como uma ameaça desagregadora. Este sentimento velado de desagregação, a sua longa persistência, é o que merece ser pensado. Por que razão a história portuguesa é marcada pela contínua necessidade de afirmação do poder central?

Em Espanha, a regionalização visou tentar resolver um problema, o das nacionalidades. Foi uma resposta. Em Portugal, porém, isso não se coloca. O que pode acontecer, todavia, é que um processo de regionalização como o previsto na constituição, venha criar um problema que não existe. Teoricamente, democratizar as regiões administrativas parece ser uma boa medida. Mas no momento em que se criam entidades políticas, não se sabe o que pode acontecer. Forças centrífugas, agora incipientes, podem ganhar poder e acabar por desestruturar uma unidade política débil, apesar dos nove séculos de história. Há uma sabedoria na história e talvez fosse útil julgar as nossas ideias actuais e os nossos preconceitos à luz daquilo que tem sido a experiência de um povo e de uma nação, que foram criados ex nihilo. Antes de se entrar no desvario das decisões em nome da putativa modernização do país, tenha-se prudência, essa virtude suprema da acção política. (averomundo, 2010/01/11)

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