A minha crónica semanal no Jornal Torrejano.
Contrariamente ao prognóstico que aqui fiz há três semanas, o Syriza
ganhou as eleições gregas. Contudo a minha leitura da realidade política, feita
na semana passada a propósito do apoio da direita radical francesa ao Syriza,
recebeu uma significativa confirmação. O Syriza coligou-se com um partido da
direita radical. De facto, vivemos novos tempos e a velha divisão direita –
esquerda já não é suficiente, embora ainda seja necessária, para explicar a vida
política em que estamos mergulhados.
Exige-se dos políticos abertura de espírito e capacidade acrescida
para evitar uma catástrofe. Há que evitar tentações extremas e abrir um caminho
frutuoso para que a Grécia, e os países que foram atirados para resgate, possam
encontrar uma senda de esperança. A principal tentação da União Europeia,
dirigida pela direita liberal, poderá ser a de usar a Grécia como vacina.
Torná-la um exemplo de como é catastrófico escolher lideranças radicais.
Contudo, as consequências dessa estratégia estão longe de ser claras. Um
falhanço do novo governo, devido às imposições extremadas da União Europeia e
do FMI, pode conduzir não ao retorno a um governo centrista e subserviente à
senhora Merkel mas a algo bem mais desagradável. Uma guerra civil é um cenário
que pode estar longe de ser delirante. E a Grécia está situada numa zona
demasiado sensível para se poder brincar às experiências, embora experiências idiotas,
por parte da União Europeia, se tenham visto na Ucrânia e na Síria.
O sensato seria encontrar caminhos de compromisso sem que ambas as
partes perdessem a face. Esta pode – sublinho pode – ser uma oportunidade para
a Grécia cortar com um conjunto de vícios ligados à corrupção e à relação
enviesada e muitas vezes oportunista dos cidadãos com o Estado. Pode também ser
uma ocasião para a União Europeia corrigir os erros políticos colossais que
cometeu, com a cumplicidade dos governos nacionais, na gestão do problema das
dívidas soberanas dos países do sul da Europa. Este será o melhor cenário, mas
não sei se a frivolidade, a ignorância, os interesses instalados não nos
encaminharão para um buraco negro, do qual nada sabemos. Nos tempos complexos e
obscuros em que vivemos, em sociedades marcadas pela imprevisibilidade e pela fluidez,
no momento em que as categorias políticas tradicionais se encontram em
farrapos, é aconselhável assumir a virtude socrática da douta ignorância. Há
que reconhecer que do futuro nada sabemos e que o mais sensato é procurar o
compromisso e a justa medida. Coisa que a antiga Grécia ensinou mas que a nova
Europa ainda não aprendeu.
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