Georges Rouault - Quem não se maquilha? (1930)
A morte do Nobel da literatura Günter Grass (ver aqui) foi mais uma vez motivo para um equívoco. Numa emissora de rádio uma universitária falava da incompreensibilidade da atitude de Grass ao ocultar, durante decénios, que tinha pertencido às Waffen-SS. Na altura da revelação do episódio, José Saramago terá afirmado que "nunca separou o escritor da pessoa que o escritor é. A responsabilidade de um é a responsabilidade de outro." Estas duas posições são semelhantes. A de Saramago é mais explícita e, por isso, permite uma contra-argumentação mais clara. O termo responsabilidade indica uma orientação que nada tem a ver com a arte e a qualidade estética das obras literárias ou outras. A responsabilidade pertence à área da moral, mesmo quando a responsabilidade é a de um escritor, de um pintor ou de qualquer outro artista.
O equívoco é querer estabelecer uma conexão entre a qualidade estética de uma obra de arte e a moralidade daquele que a produziu. A moralidade pode ser duvidosa, as opções políticas tenebrosas, o compromisso religioso pode ser intolerável, mas aquilo que para mim, enquanto leitor ou fruidor de uma obra de arte, me interessa é a experiência estética que a obra me pode proporcionar e o grau de questionamento que a obra coloca ao meu mundo ou ao mundo tal como o vejo. Por outro lado, não partilho da opinião de Saramago, pelo menos completamente, de que o escritor e a pessoa do escritor são inseparáveis. Esta ideia radica numa antropologia fundada na supremacia moderna da acção: o homem é aquilo que produz ou faz. Ora o homem é muito mais e muito menos do que aquilo que faz. É muito mais porque, apesar de tudo o que produz no mundo, mesmo que sejam obras de arte, ele é um mistério, inclusive para si mesmo. É muito menos porque a sua genialidade artística ultrapassa muitas vezes o seu comportamento social e mundano. Quando celebramos ou deploramos um escritor o que está em causa é a qualidade da sua obra. A sua pessoa, a qual é como todas as outras pessoas uma ficção itinerante, é para o caso irrelevante.
O equívoco é querer estabelecer uma conexão entre a qualidade estética de uma obra de arte e a moralidade daquele que a produziu. A moralidade pode ser duvidosa, as opções políticas tenebrosas, o compromisso religioso pode ser intolerável, mas aquilo que para mim, enquanto leitor ou fruidor de uma obra de arte, me interessa é a experiência estética que a obra me pode proporcionar e o grau de questionamento que a obra coloca ao meu mundo ou ao mundo tal como o vejo. Por outro lado, não partilho da opinião de Saramago, pelo menos completamente, de que o escritor e a pessoa do escritor são inseparáveis. Esta ideia radica numa antropologia fundada na supremacia moderna da acção: o homem é aquilo que produz ou faz. Ora o homem é muito mais e muito menos do que aquilo que faz. É muito mais porque, apesar de tudo o que produz no mundo, mesmo que sejam obras de arte, ele é um mistério, inclusive para si mesmo. É muito menos porque a sua genialidade artística ultrapassa muitas vezes o seu comportamento social e mundano. Quando celebramos ou deploramos um escritor o que está em causa é a qualidade da sua obra. A sua pessoa, a qual é como todas as outras pessoas uma ficção itinerante, é para o caso irrelevante.
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