Albert Port - Sickness book (1989)
O que é uma sociedade de mercado? É aquela em que os livros devem ser cativantes. Nem bons nem maus, cativantes. Cativantes? O leitor julga que eu estou a brincar. Não estou. Há mais um incentivo para uma escrita cativante. A partir de 1 de Julho, a Amazon vai remunerar os autores de alguns livros electrónicos com base no número de páginas que os leitores leram. Eu não estou a lamentar, estou a constatar. O mercado - a procura consumada em páginas lidas - é a única verdade que, nos dias de hoje, existe sobre um livro. O valor de um livro, nas sociedades de mercado, não está na qualidade estética, se for uma obra literária, determinada por uma elite nebulosa de leitores, como os críticos ou os especialistas universitários. Está no número de páginas lidas. Dito de outra maneira, está na capacidade de cativar do escritor, na sua habilidade para fazer com que o leitor mude de página. Quanto mais páginas tiver um livro e mais rapidamente o leitor tocar no dispositivo de leitura (eReader) para mudar de página, melhor é a obra. Pessoas levadas por um hegelianismo tardio poderiam ainda pensar que a quantidade, pelo artifício dos deuses da dialéctica, se transformaria em qualidade. Puro engano. Nas sociedades de mercado, a dialéctica corre rio acima: é a qualidade que se deve transformar em quantidade. Portanto, autores de todo o mundo escrevam páginas e páginas cativantes.
Sem comentários:
Enviar um comentário
Nota: só um membro deste blogue pode publicar um comentário.