A minha crónica quinzenal no Jornal Torrejano.
Todo este drama que envolve a Grécia não passa de uma aparência, de um
véu que oculta o movimento que atinge as configurações das sociedades europeias.
E não é apenas nas crónicas infinitas sobre as dívidas públicas que algo se
esconde. Também nas subidas eleitorais dos partidos nacionalistas – sejam de
esquerda, como o Syriza, ou de direita, como a Frente Nacional, em França – se
sente que qualquer coisa está oculta e que procura um caminho para se
manifestar. Este borbulhar da Europa é sintoma de algo que ainda não conseguimos
compreender.
Por outro lado, as convulsões europeias não são o único dado a ter em
conta. O mundo islâmico, apesar das múltiplas divisões que o atravessam,
retornou à sua condição de protagonista histórico de primeira linha. Também a
Rússia, depois do período de luto pelo império soviético, assume um papel
fundamental na situação internacional. Para além disso, há que ter em conta os
interesses da China, da Índia, da América Latina, com o Brasil à cabeça. Mas
não é apenas a vertente geopolítica que está a dinamitar a configuração do
mundo a que nos habituámos. Os problemas ambientais, as peripécias da
demografia, os desenvolvimentos científicos e a intercomunicação global são
factores tão ou mais poderosos do que os geopolíticos no actual estado de
incerteza.
O futuro é, para nós, obscuro, velado por uma densa neblina. Uma
neblina matinal, digamos assim. Mas há coisas que sabemos já. O mundo que começou
a ser edificado com a expansão marítima dos portugueses e dos espanhóis está
agonizante. Esse mundo, onde a Europa teve o papel central, encontra-se nos
seus estertores finais. É uma lenta agonia que começou em 1914 e que se
prolonga até aos dias de hoje. Esta agonia, contrariamente ao que aconteceu em
1945, é irreversível. O doente não tem cura. Não sabemos o que vem aí, mas
conhecemos aquilo de que nos estamos a despedir. Nem tudo foi bom. Nem tudo foi
mau. Tinha porém a nossa marca e isso era o suficiente para nos sentirmos em
casa.
O drama grego, as peripécias eleitorais, as gripes nacionalistas, o
nervosismo dos mercados, a arrogância do dinheiro, tudo isso é sintoma de um
futuro que quer chegar, que talvez já tenha chegado, mas para cuja figura os
nossos olhos, habituados à luz do passado, são impotentes. Mas não são apenas
sintomas desse futuro. São também os sinais de uma morte anunciada, de uma
agonia que parece não ter fim. São signos de uma consciência melancólica
marcada pela nostalgia e para qual não resta mais nada senão a entrega ao
devaneio da saudade.
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