Jan van Goyen - Landscape with Two Oaks (1641)
Tudo arde na brancura da tarde,
uma chama acampa pelas terras áridas. As palavras crescem roídas de saliva, os
dias a fazem aumentar, e a teus pés os rebanhos metálicos deitam-se vorazes,
estradas cospem-nos terra fora. Os deuses procuram os bosques sombrios, onde as
tardes cantam matinas e o fogo é agora um astro de sidra no solo da memória. Esfarelado,
coberto de erva rala, pequenas poças de água tépida, restos de ramos e pássaros
de olhos vesgos. Os cães latem, coçados na sarna, a zumbir entre canaviais e as
desventuradas ruas da cidade.
Na ardência dos dias, os homens
das coisas se apossam, correm funâmbulos, e na precipitação a tudo abandonam e à
sua imagem de vidro erguem, em temor e súplica, as mãos. Na sombra ansiosa,
espreitam entre relógios, horas e dias, um caminho ainda haverá, dizem, ruas de
algas roxas pelos bordos, uma estrada de ruídos, insectos de cinza, plantas
melíferas pelos matagais de fogo, e uma ardência, a tudo, no inquieto coração,
se apega.
Eu não tenho uma mão forte, nem
do ramo da oliveira construo bordão a que, no clamor da tarde, me encoste. Sigo
preso no horizonte e, onde me levam aqueles que me levam, eu vou. Sem o caminho
saber, eu vou, na ardência que me leva, eu vou, apenas porque alguém me leva,
como se fugisse das lâmpadas da noite e dos vagos faróis com que, em estradas
de colmo, automóveis tracejam, ímpios, a santidade da noite. Levantam-se então
os amantes, vejo-os, os corpos despidos de carne. Gritam. Gritam pelo fogo que,
um dia, tão ao de leve, teria ardido como restolho na fulguração da campina
infectada.
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