segunda-feira, 11 de abril de 2016

Escola, desejo e impotência

Pieter Brueghel el Viejo - O asno na escola (1556)

Por um acaso li ontem três entrevistas sobre a questão educativa. Duas do espanhol Gregorio Luri (aqui e aqui) e uma do português José Pacheco, um dos fundadores da célebre Escola da Ponte (aqui). Em linhas gerais, a minha posição, até talvez devido à formação comum, está muito mais próxima de Luri do que de José Pacheco. No entanto, há uma coisa, dita por José Pacheco, que, devidamente matizada, merece ser pensada: com aulas ninguém aprende. Isto não é bem assim, mas cada vez se aproxima mais da verdade. Há alunos, ainda em número significativo, que aprendem com as aulas, mas, a  cada dia que passa, aumenta o número de alunos que, na verdade, pouco ou nada aprendem nas aulas. A minha percepção, a partir da observação diária, é que a aula, onde se deve ensinar e deve aprender, se tornou um lugar absurdo. 

Não tenho qualquer solução para a situação. Assisto há décadas a tentativas de reformas do sistema e a iniciativas de professores e escolas para enfrentar o problema e o resultado é sempre o mesmo: a aula mantém-se quase inalterada. Há apenas uma diferença: cada vez mais os alunos a desvalorizam. Esta desvalorização da aula tanto atinge aulas de professores pouco talentosos ou de professores muito talentosos. Por outro lado, apesar das injunções do ministério e das invectivas dos pedagogos, a verdade é que tudo está desenhado para que o ensino seja o mais tradicional possível: uma sequência de aulas expositivas, aqui e ali atravessadas por aulas pretensamente mais práticas. Toda  a retórica sobre a inovação pedagógica não passa disso mesmo, retórica. Retórica vazia. Tudo está pensado e organizado para obter os resultados medíocres que se obtêm.

As posições de Luri, ao enfatizar o esforço, e as de Pacheco, ao enfatizar o prazer, como motores da aprendizagem parecem-me, contudo, dois pólos de um falso dilema: ou o prazer ou o esforço. Talvez exista uma outra alternativa. Aristóteles inicia a Metafísica dizendo que todo o homem deseja naturalmente conhecer. Isto significa que a aprendizagem para obter conhecimento não apenas pertence à natureza humana como ela tem a sua raiz no desejo. Aprender é um desejo natural nos seres humanos. Aqui surge uma questão decisiva: por que razão os alunos - ou muitos deles - perdem este desejo natural? Por que motivo o sistema educativo, as escolas, as aulas matam o desejo de aprender e de conhecer? Por que motivo este desejo não procura o prazer, não se esforça por se saciar e acaba por enfraquecer e desaparecer? Dito de outra maneira: por que razão muitos dos nossos alunos, desde muito cedo, se tornam cognitivamente impotentes? Por muito importantes que questões como as da avaliação, dos currículos, da organização escolar, etc. sejam, sem a clara compreensão deste problema, todas as alterações na educação apenas contribuirão para aumentar o ruído, tornando os alunos cada vez mais incapazes de sentir o prazer que o esforço de aprender traz consigo.


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