Arnold Genthe, Modern Torso, ca. 1918 |
Brilhavam
os sapatos cor de âmbar. Os saltos tornavam-na mais esguia. Imóvel, ela estava
ali para ser observada, para que olhos a percorressem com demora, sem a
precipitação de um desejo cru e pouco meditado. Um manto de penas, talvez uma
sugestão de leveza ou uma promessa de voo, cobria-lhe o lado direito, mas o
esquerdo entregava-se nu à contemplação. O braço contornava o seio, fazendo-o
reverberar, sublinhando-lhe a textura de seda e uma luz intensa, juramento de
um prazer tão próximo, que os olhos meridionais, estrelas vacilantes,
desmentiam. A nádega sobressaía ligeiramente, num equilíbrio que evitava a
exuberância da provocação, desenhando-se com a difícil contenção que escarnece
o desejo primitivo e sugere a necessidade de uma longa aprendizagem da harmonia
dos corpos e da disposição dos espíritos. A mão que segurava o manto acima do
seio desnudo exibia dedos longos, tão frágeis e imponderáveis que faziam
lembrar uma vocação espiritual abandonada. O cabelo, de um castanho escuro, cingia-lhe
a cabeça ao abrir-se a partir de um dissimulado risco lateral, para lhe cobrir
a orelha e parte da testa, recortando um triângulo irregular acima da
sobrancelha esquerda. O rosto hesitava longamente entre o ovalado e o redondo,
mantendo-se num equilíbrio instável, de sentido difícil de descodificar. O
nariz fino e voluntarioso esculpia-lhe uma sombra ascética no semblante. A
boca, porém, apressava-se a contrariá-lo, ao oferecer uns lábios carnudos,
recortados, uns lábios que chamavam outros, sugerindo um ardor que brotava do
fundo do ventre e florescia ali, chamando o desejo de quem os observava e se
deixava arrastar na ilusão voluptuosa, na insinuação de uma entrega que o tempo
havia de desmentir.
O suave e belo deslizar do erotismo. Magnífico!
ResponderEliminarUm abraço
Muito obrigado.
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