Salvador Dali - Construcción blanda con judías hervidas (Premoción de la Guerra Civil) (1936)
Este artigo de Ana Sá Lopes, no ionline, sobre a perspectiva de Paul Krugman acerca da crise do défice, deve ser cruzado com este post de Medeiros Ferreira, no Cortex Frontal, onde recorda o artigo do economista alemão Hans-Werner Sinn, no Le Monde de 1 de Agosto pp, no qual é aventada a possibilidade dos países sob resgate correrem riscos de entrar em guerra civil devido às condições que lhe são ditadas para continuarem no euro. Para completar e por falar em guerra civil, dever-se-ia ainda ler o artigo de Manuel Loff, no Público de hoje (link disponível só para assinantes) A Espanha da Transição acabou.
Do ponto de vista filosófico, a discussão pode ser muito interessante. A política alemã é motivada por um juízo moral negativo e, por isso, visa punir a "irresponsabilidade" orçamental dos países em dificuldades ou, pelo contrário, a Alemanha segue uma conduta pura e simplesmente egoísta e predadora dos mais fracos? No primeiro caso, a desgraça - onde se poderia incluir a guerra civil - seria uma forma sacrificial de lavar com o sangue a moral ofendida e restabelecer a aliança com os deuses nórdicos. No segundo, a questão é mais fria e racional. A desgraça dos países é economicamente interessante para a Alemanha e politicamente útil para a senhora Merkel.
Dilemas filosóficos à parte, aquilo que se percebe é que a Alemanha tem todo o interesse político e económico nesta situação dos países do Sul da Europa. O pânico auto-induzido dos mercados, alimentado pelas políticas de austeridade adoptadas, leva-os não só a emprestar dinheiro a juros proibitivos aos países em dificuldade como a pagar à Alemanha para receber esse mesmo dinheiro como empréstimo. Que interesse pode ter a Alemanha e a senhora Merkel, em particular, que a vida na Europa do Sul retorne à normalidade, se a crise permite financiamento a juros negativos? Não valerá isso o risco de guerra civil num país da periferia? Longe de haver uma classe política inculta e ignara, o que existe é um frio cálculo de possibilidades. O moralismo da retórica alemã serve para cobrir a imoralidade das suas políticas. Como se sabe, a política não se confunde com a moral e a Alemanha só parará quando pressentir que as suas opções a poderão prejudicar. Do ponto de vista dos povos do sul, contudo, é claro que qualquer apoio à política alemã configura um acto de traição nacional. E que coisa mais abominável pode haver do que a traição? Ou será que até a traição a um povo passou a ter valor moral?
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