Salvador Dali - Nacimiento del Nuevo Mundo (1942)
Em tudo o que se está a passar, na enorme confusão que se desenhou na sociedade portuguesa, há uma coisa que escapa tanto a governantes como a governados. Essa coisa poderia ser chamada a irrupção do novo. Há períodos na história em que a substituição de gerações se faz de forma ordeira e pacífica. Essa tonalidade amena leva-nos a ver esse modelo como aquele é que natural e bom. No entanto, há períodos em que a história parece acelerar-se e a irrupção do novo faz-se de uma forma mais dura e violenta. Faz-se pela expulsão do velho, das antigas gerações que ainda não são suficientemente velhas para abandonarem os lugares que ocupam, mas como o espaço escasseia e não há lugar para a substituição benigna, o novo toma a figura da turbulência e da violência.
A forma como essa expulsão violenta se dá não está definida. Pode ser através de uma revolução política como aconteceu em 1974 ou pode ser através de uma crise económica e financeira como a que está a ocorrer. Aquilo a que estamos a assistir é a turbulência da eclosão do novo. E isso está a acontecer com uma violência inaudita perpetrada sobre o velho. A tendência das pessoas, fundamentalmente das que são afectadas, é não perceberem assim os acontecimentos. Em primeiro lugar, porque são atingidas e vêem o acontecimento pelo lado sombrio da injustiça que sentem na pele. Em segundo lugar, porque há uma tendência para se ver a irrupção do novo como um bem, como o triunfo de um novo mundo, que seria melhor e mais livre do que o anterior. Ora este novo mundo que está a irromper parece ser bem pior do que aquele que tem vigorado.
Ora nada está escrito na natureza que impeça que a irrupção do novo seja injusta para o velho mundo. Também nada está inscrito na natureza das coisas que imponha que a novidade seja um bem. Essas são as nossas ilusões. Há uma mecânica na história que traz, inevitavelmente, estas convulsões. A exuberância da vida que não tem lugar para dar vazão à energia acumulada e a senectude rígida daquilo que ocupa ainda os espaços sociais existentes são um chamariz para a turbulência que está a suceder. Aquilo que está acontecer não é uma luta de gerações, é qualquer coisa mais profunda do que isso. É algo de não humano que se manifesta, como uma necessidade, na sociedade humana.
Contrariamente ao que se possa pensar, este carácter de necessidade natural inscrito nesta turbulência não desculpa a governação do país - esta e as anteriores. Poder-se-ia pensar que como a turbulência da irrupção do novo se manifesta como uma força da natureza, o governo não seria responsável pelo mal que vai acontecer a muitos de nós. Puro engano. O dever dos governos - se eles não fossem ocupados por gente intelectual e politicamente desqualificada - seria compreender estes processos naturais, antecipar as situações, e organizar a vida social de forma a evitar as situações violentas da irrupção do novo. Como isso não foi feito e não está a ser feito, só podemos esperar uma tremenda desgraça, a qual espreita já no horizonte. Não vai ser bonito aquilo que vem aí, seja o que for.
Estes cultores do novo, nunca poderão, mais tarde, referir-se aos "Bons velhos tempos" porque são ineptos e, pior, porque vão ter o vazio e o remorso (?) a ocupar-lhes o espaço da memória.
ResponderEliminarAbraço
Há, no entanto, um problema muito grave em Portugal e na Europa relativo às novas gerações. Elas estão sem lugar. Não estudam nem trabalham. Há uma situação que deveria ter sido pensada e acautelada. A demissão dos governos da regulação da vida social, segundo o credo liberal, conduziu a este beco. E este beco cada vez me parece mais um beco sem saída. Ou antes com uma saída muito, mas mesmo muito desagradável.
EliminarAbraço
Penso que não existem precedentes históricos na convivência de tantas gerações em simultâneo. A almejada longevidade, uma quimera de cientistas, e de gente que não aceita a efemeridade e a insignificância, produziu uma sociedade onde todos sobram, sobram velhos, sobram crianças, sobram homens e mulheres, sobram todos, menos os que pagam para existir para além das condicionantes da natureza.
ResponderEliminarTenho uma visão muito crítica, e ácida, sobre este tema.
Bons Dias e Bom dia de Todos os Santos.
Esta é uma das aporias das sociedades modernas. O problema é que esta aporia tem todo o aspecto de não ter solução, a não ser uma solução drástica marcada pela revolta da própria natureza.
EliminarBom dia de Todos os Santos