A minha crónica no Jornal Torrejano.
Há em certos sectores políticos portugueses, de direita e de
esquerda, de forma mais ou menos velada, a expectativa de qua a acção de Donald
Trump acabe, paradoxalmente, por ser benéfica. Vale a pena, por isso, pensar
aquilo que veio a lume na recente entrevista dada pelo novo presidente
norte-americano aos jornais Times e Bild. Refiro-me aos ataques à NATO e à
União Europeia (UE). Quando um presidente americano vem dizer que a NATO está
obsoleta e que mais países vão sair da União Europeia está a criar,
deliberadamente, uma situação tão melindrosa quanto perigosa. Imaginemos – e
nada nos diz que não vá ser assim – que a NATO desaparece e que a UE se desintegra. Será que nós portugueses teremos
razões para festejar?
Apesar da experiência negativa do euro – em parte da nossa
responsabilidade e em parte das regras do euro – a ligação de Portugal à UE é
central para a viabilidade económica e política do país. Podemos imaginar o que
seria Portugal sem a adesão à União. Foi ela que nos permitiu fugir de uma
miséria atávica e termos, apesar de tudo, um país onde não é mau viver. Sem
essa adesão, não seriam só as auto-estradas que não existiriam. O sistema de
saúde seria irrisório e o educativo continuaria confinado a uma minoria. Talvez
tivéssemos um conjunto de indústrias obsoletas a viver de mão-de-obra ainda
mais mal paga do que a actual. Estaríamos confinados a uma tira periférica da
Península Ibérica, fechados, paroquiais e muito mais pobres do que somos.
Desgraça maior seria, contudo, o fim da NATO. A pertença a
esta organização militar é a salvaguarda da nossa independência e o factor
determinante da segurança de Portugal e dos portugueses. Portugal não tem
apenas uma fronteira com Espanha. Tem uma a Sul com o mundo árabe. E as
convulsões no Norte de África, caso a NATO desapareça, tornar-se-iam de
imediato uma ameaça, ainda maior, à Europa do Sul, logo a Portugal. Se a NATO
acabar e os EUA desistirem da Europa como espaço de cooperação e defesa comum,
só podemos esperar o pior. Se se assistir a um efeito cumulativo, desintegração
da UE e fim da NATO, o cenário então pode ser infernal. Cresceriam as
possibilidades de conflitos intra-europeus e as ameaças vindas de fora elevar-se-iam
exponencialmente. Em poucas décadas poderemos passar da zona mais rica e
civilizada do planeta para o caos e a pobreza generalizados. Se é isto que
queremos, compreendo certas expectativas na acção de Trump. Se não é, o melhor
é ficarmos muito preocupados e exigir que os líderes europeus encontrem uma
resposta a estes problemas. Acabou a confiança no amigo americano.
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