Juan Suárez Ávila, Paisaje imaginario, 1974 |
A custo o sol penetra a rua, apenas naquele momento em que cai a pique
e logo começa a trepar pelas paredes dos prédios para se afastar, até que
passadas vinte e quatro horas volta, se o dia não for toldado por nuvens grávidas
de cinza e chumbo, prontas a desabar sobre a terra em grossas gotas de chuva.
Não se avista ninguém, apenas as sombras desenham estranhas figuras, que se vão
transformando perante o olhar. À esquerda, vê-se o anúncio de um hotel, daqueles
onde se acolhe, quando chega à cidade, gente vinda dos campos, pouco abonada
pelo trabalho da terra. Depois, os prédios de seis andares, são dedicados à
habitação, apartamentos lúgubres, de vidros sujos. Num ou noutro prédio, há
varandas onde se avistam plantas raquíticas. Há portadas entreabertas, mas
ninguém parece espreitar por elas. Ao nível do rés-do-chão vêem-se alguns
portões de metal, mas não escondem qualquer comércio, são apenas armazéns
alugados a comerciantes que abriram o seu negócio em ruas mais promissoras,
mais largas, onde a luz se demora com mais vagar e a massa dos clientes se
passeia despreocupada, deixando-se ver quando a luz bate sobre os seus rostos
pintados pelo quotidiano. O outro lado da rua é uma mancha negra de prédios
desabitados, envelhecidos, casas construídas séculos atrás e onde ninguém que gastar
os seus dias e as suas noites. Talvez um ou outro sirva de acomodação a algum
sem-abrigo, mas o que sobressai é as manchas negras que os fungos multiplicados
na humidade semeiam. Os caixilhos ainda vão segurando vidros, aqui e ali já
partidos. Num ou noutro prédio, a porta da rua foi substituída por uma parede
tosca, daquelas feitas de tijolo e cobertas de cimento, para evitar que se
intrometam por ali, e um acidente faça nascer um fogo, ou que a casa abandonada
seja lugar para um crime terrível. O tempo passa pela rua, enche-a de rugas e pústulas,
sem que um veículo se atreva a passar pelas lajes gastas que a pavimentam. Uma
mulher curvada, apoiando-se numa bengala, surge ao fundo. Desloca-se com vagar,
passos trémulos, o olhar no chão. Uma gabardine envelhecida quase toca no chão.
Traz com ela uma pequena maleta, que parece ter um peso excessivo para as suas
forças. Detém-se perante a porta do hotel, poisa a mala no chão. Da algibeira tira
um papel. Olha-o e olha para a designação do hotel. Guarda a informação de onde
a tirara, pega na mala e entra.
Muito bom.
ResponderEliminarUm abraço
Muito obrigado.
EliminarAbraço