Amadeo de Souza-Cardoso, Le Tigre, 1912 |
The fascist
politician possesses specific techniques to destroy information spaces and
break down reality.
Jason
Stanley, How Fascism Works
Aquilo a que temos vindo a assistir nos últimos anos – e agora
também em Portugal de forma muito clara – é a um processo que, fundado na propaganda
e ampliado pelas redes sociais, visa destruir a relação do cidadão com a
realidade e aquilo a que os anglo-saxónicos chamam common sense. Uma
definição de senso comum pode ajudar a perceber o que está em causa. Por senso
comum entende-se o nível básico de conhecimento prático e de capacidade de
julgar que todos necessitamos para viver de um modo razoável e seguro (ver aqui).
O primeiro passo na destruição do senso comum inerente aos
regimes de democracia liberal é dado no campo da informação. Trata-se de demolição
a esfera pública através de processos de uso da desinformação e da mentira. Trata-se de subverter a distinção entre a informação verdadeira e a falsa. Não é
apenas o caso de se usar a mentira, mas de algo muito mais tenebroso. Fazer
crer às pessoas que a mentira é a verdade e que a verdade é pura e simplesmente
uma conspiração e uma mentira. Neste processo de subversão, o ataque aos media
mais credíveis é impiedoso, enquanto se promovem órgãos de comunicação
enviesados, fantasiosos, mentores de teorias da conspiração, lugares de pura
propaganda.
Este processo de destruição da esfera pública onde deveria
ocorrer um debate político informado é, ao mesmo tempo, um fim em si mesmo e um
instrumento para outra coisa. Ele visa também fazer com que os cidadãos deixem
de ter qualquer relação sensata com a realidade, para criar, desse modo, uma
irrealidade propícia às políticas populistas (fascistas ou outras), para deslocar
a questão política de um espaço onde as afirmações são confrontadas com a
realidade, para um espaço onírico, em que qualquer afirmação contrária aos
políticos populistas é desmentida e, em sentido contrário, as mais delirantes
teorias encontram apoio. A verdade passa a ser aquilo que agrada e não aquilo
que está de acordo com os factos.
O que está em jogo nas tácticas dos políticos populistas é a
destruição, nos cidadãos, daquele nível básico de conhecimentos práticos e de
capacidade de julgar os factos que permite aos homens viver razoavelmente e em
segurança. Aquilo que muitos dos apoiantes deste tipo de políticos não percebem
(outros sabem-no muito bem), cegos pelo seu ressentimento e pela propaganda, é
que a destruição do senso comum na política é o caminho para a destruição de
uma vida razoável e segura, o começo de uma aventura que, por norma, acaba na
mais atroz violência e com muitos cadáveres no caminho. O populismo
nacionalista – tenha ou não um claro cariz fascista – é um perigo para todos
aqueles que querem viver razoavelmente em paz e segurança.
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