A minha crónica semanal no Jornal Torrejano.
Perante mais um chumbo do Tribunal Constitucional (TC), uma das linhas
de argumentação pró-governamental diz que o problema não está na Constituição
mas nas interpretações que dela são feitas pelos juízes do TC. Por outro lado,
como reforço do argumento, membros do governo e apoiantes afirmam que as
decisões do TC não estão acima da crítica. Nos dois casos está a lançar-se
poeira para os olhos dos cidadãos para esconder aquilo que é evidente: o
governo quer governar contra a Constituição e as regras constitucionais.
Comecemos pela primeira questão. A Constituição é um texto escrito e
como todos os textos escritos está sujeito ao conflito das interpretações. Não
há uma interpretação da Constituição que seja a verdadeira e autêntica
interpretação, que todos nós reconheceríamos como válida e, facilmente,
descobriríamos se uma lei seria ou não constitucional. Se existisse essa tal
interpretação, o TC seria uma redundância e, por certo, nunca teria chegado à
existência. Como não existe, a única solução é a existência de um TC que,
segundo a consciência dos seus membros, determina o que está ou não de acordo
com a Constituição.
Mas as decisões desse TC estão acima da crítica? Claro que não. Numa
sociedade democrática, onde existe liberdade de expressão, todas as decisões
são discutíveis e criticáveis. Este facto, porém, não invalida um outro. Para
efeitos práticos, as decisões do TC são infalíveis. Isto quer dizer que os
juízes do TC são assistido pelo Espírito Santo e possuem a tal interpretação
válida da Constituição que ninguém tem? Não, significa apenas que não há
recurso das suas decisões. Elas são para cumprir e, do ponto de vista prático,
discuti-las ou não tem o mesmo efeito. São as regras do jogo numa sociedade
pluralista.
O incómodo do governo e dos seus apoiantes está no facto de conviverem
mal com as regras democráticas, entre elas a submissão da acção política à lei,
quando a lei lhes desagrada. A nossa Constituição é uma força de bloqueio a
este governo? É. A este e a qualquer outro. As constituições existem para bloquear
os apetites de quem está no governo, para limitar a sua acção, para obrigar o
governante a conter-se em determinadas linhas que são amplamente maioritárias
dentro da comunidade. O TC, na sua infalibilidade, regula o carácter
constitucional ou não das leis produzidas pelos governos. Se não se aceita
isto, se não há força para mudar a Constituição, o que se pretende? Condicionar
a justiça? Empurrar o país para a guerra civil para impor uma Constituição ao
gosto do tempo?
Uma Constituição ao gosto do tempo?
ResponderEliminarCom ligeiros ajustamentos a de 1934 servia-lhes na perfeição.
E em matéria de Tribunais e de "Justiça"; há por lá muita gente que não desdenharia dos "plenários"...
Abraço
Não precisam da Constituição de 1934, a liberdade basta-lhes. Basta legislar contra as formas de solidariedade presentes no Estado Social para atingirem os seus objectivos. Sabem perfeitamente que retirar a regulação das actividades humanas é muito mais eficaz para os seus objectivos (concentração da riqueza nas mãos de alguns) do que instaurar uma polícia política, uma comissão de censura e proibir os partidos políticos.
EliminarAbraço