terça-feira, 24 de setembro de 2013

Falhar uma grande carreira

Ernst Barlach - Prophet Writing (1919)

Por motivos que não vêm para o caso, fui aconselhado, e muito vivamente, a estudar economia. Eram bons aqueles tempos para quem se decidisse por tal caminho. Mas com o pouco sentido das coisas que me caracteriza, dispensei o conselho e, dando vazão aos meus instintos mais primitivos e contraditórios, decidi estudar filosofia, porque - veja-se a incoerência - me interessava a literatura (meu Deus, o que se pode esperar de alguém que se interessa por literatura e filosofia?). Quando vejo, porém, coisas como estas (o economistas-chefe da OCDE dizer que não é tempo de complacências) quase me arrependo por não seguido o vivo - e aliás desinteressado - conselho. Porque ser economista é muito mais do que ser economista. 

O economista é uma entidade metafísica (um espírito? um espectro? um fantasma?) que exerce, sem precisar de consentimento superior, a actividade profética. Profetiza números e taxas, caminhos a seguir e a evitar. Ora, se tivesse estudado economia, faria parte do coro dos profetas e arengaria por jornais e televisões. Nas minhas palavras haveria conselhos e ameaças, muita moral para que o futuro nos chegasse sorridente e para evitar castigos maiores pelas imoralidades presentes. E se as minhas profecias falhassem, como têm tendência a falhar as dos economistas? Não seria isso um verdadeiro descalabro para a hipotética reputação? Por Toutatis, não sou assim tão ingénuo. Como qualquer economista, falaria em linguagem cifrada e nunca esqueceria de referir o carácter conjectural da realidade. Pois quando as profecias de um economista falham, não é o profeta que se engana, mas a realidade que está errada. Acho que falhei uma grande carreira.

4 comentários:

  1. Acho que não falhou, bem pelo contrário.

    http://bonstemposhein-jrd.blogspot.pt/2011/05/as-ostras-e-as-perolas-20.html

    Abraço

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    1. Cada vez que vejo ou leio o dr. Cavaco sinto-me recompensado por não ter tido a tentação de pertencer à seita.

      Abraço

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  2. As generalizações são sempre um bocadinho redutoras. Às tantas ainda é capaz de haver um ou outro que se aproveite...

    Mas sabe qual o grande problema dessa perigosa raça? é que é malta que mexe bem em números mas que também aprendeu umas coisas de história e de política e, portanto, tanto dá uns toques nos números, como nas letras, ou seja, estão relativamente bem habilitados a lançar a confusão quando convém (atenção: não disse que o fazem sempre; apenas que estão habilitados a fazê-lo...). Mas, enfim, isto sou eu a falar.

    :)))

    Boa noite!

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    1. Por certo existirão muitos com pouca propensão para a profecia. Mas esses são os que ainda sabem história. A classe dos profetas substituiu o conhecimento empírico do passado pela axiomatização da disciplina. Julgam que reduzir a vida a algoritmos é o mesmo que observar o voo das aves ou lançar búzios.

      Boa-noite.

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