Há dias lembrei-me do filme Império da Paixão (1978), do realizador
japonês Nagisa Oshima. A película trata do amor de um homem e de uma mulher,
mas um amor assediado pela presença do fantasma do velho marido dela, que eles,
para consumarem livremente a sua paixão, tinham assassinado. A recordação deste
filme foi desencadeada por dois cartazes da campanha eleitoral para a Câmara de
Torres Novas. Em cada um dos cartazes vê-se o candidato a Presidente – Pedro
Ferreira (PS), num, Henrique Reis (PSD), no outro – ao lado, na verdade
ligeiramente à frente, de uma outra personagem, António Rodrigues e Arnaldo Santos,
respectivamente.
Dirá o leitor, e não sem razão, que essas personagens são os candidatos
dos respectivos partidos à Assembleia Municipal, e por isso se justifica a sua
presença nos cartazes. Dir-me-á também, se conhecer a concelho e tiver uma
percepção dos partidos locais, que António Rodrigues e Arnaldo Santos são
pessoas com muito peso na sociedade torrejana e, desta maneira, são importantes
apoios para os candidatos respectivos. É verdade, mas o problema está todo aí.
Não é que Pedro Ferreira e Henrique Reis, talvez mais o primeiro do
que o segundo, não tenham, no concelho, um peso político próprio. Têm, mas…
António Rodrigues e Arnaldo Santos foram os últimos presidentes da Câmara e o seu
peso político e influência na sociedade local ultrapassa o peso e a influência
dos actuais candidatos. Os dois cartazes, aparentemente banais, quando
interpretados no contexto do sociedade torrejana ganham conotações
absolutamente perversas.
O eleitor atento não vê apenas neles a promoção de uma equipa que se
candidata a dois cargos, ou o apoio explícito de alguém que já desempenhou o
cargo de Presidente do Município ao seu candidato. De imediato, lhe vem ao pensamento
a ideia de tutoria. Pelo seu peso político esmagador, António Rodrigues e
Arnaldo Santos surgem como os tutores dos candidatos dos seus partidos. O que
fragiliza, ipso facto, as próprias candidaturas de Pedro Ferreira e Henrique
Reis.
O perigo maior advém, todavia, do facto de António Rodrigues e Arnaldo
Santos se terem tornado fantasmas. No filme de Oshima, o marido assassinado não
pode amar a mulher mas aparece aos amantes com dedo acusador, e essa sua
presença fantasmática leva-os ao desespero e à perdição. Também António
Rodrigues e Arnaldo Santos não poderão exercer o poder municipal, mesmo que o
seu partido vença, mas a sua presença fantasmática será mais real do que a
presença de qualquer vereador eleito. Terrível é ir viver para uma casa
assombrada.
Não conheço os personagens, mas penso que a situação pode ser extrapolada por esse país fora com ou sem fotos nos cartazes.
ResponderEliminar(v.g. Oeiras...)
Abraço
Pois... Oeiras será pior, obviamente...
EliminarAbraço