René Magritte - On the Threshold of Liberty (1929)
Não se esqueça de que eu sou um
cruzamento. Talvez exista ainda uma gora de puro sangue prussiano nas minhas
veias poluídas. Talvez este dedinho seja o dedo de um sargento instrutor
prussiano… Você, Christoph, com os séculos de liberdade anglo-saxónica atrás de
si, com a Magna Carta gravada no coração, não pode compreender que nós, pobres
bárbaros, tenhamos necessidade da dureza de um uniforme para nos mantermos
verticais. (Christopher Isherwood, Adeus
Berlim, p. 206).
Ai de nós, pobres rebentos de mil cruzamentos, que não temos nenhuma
Magna Carta gravada no coração nem uniforme que nos sirva. Não arrastamos nos
nosso genes os séculos de liberdade anglo-saxónica, nem sabemos o que é a dura
necessidade da disciplina prussiana. Que fazer com um povo como nós? Olhe-se
para o presente drama em que somos figurantes culpados e passivos. Oiço os
tristes rapazolas e raparigas enxofradas que nos governam e não consigo deixar
de rir. Eles, que são o fruto da mais pura bastardia política e social, imaginam – é tão fácil delirar – que governam um povo que aspira à liberdade dos ingleses sob a estrita
necessidade disciplinar dos alemães. Se houvesse um módico de inteligência
naquelas cabeças – ou um mínimo de informação – teriam compreendido que não só
a liberdade britânica é incompatível com a necessidade germânica, como tudo
isso não passa, para os exaustos descendentes dos lusitanos, de um devaneio de
crianças. Mas inteligência e a informação histórica é coisa que repugna aos
indigentes que tomaram conta de Portugal. Com o seu culto bastardo da liberdade
inglesa e da disciplina alemã, a única coisa que fazem é espalhar, entre um povo aturdido, a sua própria
indigência.
Disse René Magritte: Les choses visibles peuvent toujours cacher d'autres choses visibles.
ResponderEliminarHá conclusões que magoam, mas os indigentes que tomaram conta de Portugal são a “elite”, leia-se, os mais espertos, de um povo indigente há muito constrangido pelo fatalismo histórico.
As excepções pouco mais são do que um pormenor que se dilui irremediavelmente nesta verdade axiomática.
Um abraço
Neste caso elite significa os mais indigentes. Os mais cegos guiam os cegos.
EliminarAbraço