Georgia O'keeffe - Black abstraction (1927)
As montanhas morriam num lago azul. Aqui e ali, pequenos bosques
ocultavam um mundo sombrio de onde subia um cântico primaveril. Seriam pássaros
trazidos pelo crepúsculo ou mulheres que colhiam pequenas
bagas cor de cinza. Algumas casas abriam-se sobre a enseada, mas no cais não
havia barcos. Só, de cana de pesca esquecida entre mãos, um homem fitava o
horizonte. Não tinha cor, talvez não tivesse roupa, pois tudo nele se fundia
numa sensação de ausência. Passaram horas, o canto extinguiu-se, o sol
declinou. As árvores eram apenas uma deformação na paisagem, de onde todas as
cores se iam retirando. No cais continuava esquecido o pescador, a cana na mão,
o olhar no poente. Quando se ouviu um barulho de pedra a cair nas águas, o
crepúsculo entrou pelos olhos extasiados do pescador. Assim começou a noite do mundo. (averomundo, 2008/06/03)
Uma pedra(da) na água bastou para anunciar a noite.
ResponderEliminarUm abraço
Como se o rasgão assim produzido abrisse uma brecha por onde a luz se foi.
EliminarAbraço.
Hiroshima.
ResponderEliminarTalvez Hiroshima seja apenas uma parte dessa noite. Pode-se mesmo perguntar se será a mais escura.
EliminarHaverá noite mais escura do que Hiroshima? Não a consigo conceber. Hiroshima é a aniquilação total de todos e de tudo, o vácuo nuclear absoluto.
ResponderEliminarHiroshima pode ter sido um passo decisivo na degradação moral da humanidade, pelo menos da humanidade ocidental. Julgo, contudo, que podemos imaginar - e até esperar - algo bem pior do que Hiroshima. A catástrofe pode vir sem ser pela alta tecnologia. Veja-se o que se está a passar no Iraque e na Síria.
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